3 de jan. de 2010

QUE SE SUBVERTA O CORAÇÃO


O historiador britânico Arnold Joseph Toynbee foi criticado por ser mais moralista e cristão do que observador objetivo do curso da ascensão e queda das civilizações. Ao contrário de Marx, que subordina a História à economia, e de Spengler, que identifica determinismo na condução dos fatos humanos, no interior de cada sociedade em particular, ele não vê as civilizações isoladas. Elas se comunicam, e cada uma delas tem alguma coisa a ver com as outras. Toynbee morreu certo de que as civilizações crescem com a esperança, quando se nutrem de forças espirituais, e decaem quando seus líderes esmorecem, perdem o elã criativo, desistem da continuidade no tempo.
Quando já passara dos setenta anos, (entre 1961 e 1964), Toynbee fez as suas últimas viagens de trabalho à África. Ele se interessara pela História em Atenas, quando era ainda muito jovem e fora estudar na Grécia. Passado mais de meio século, atravessou o Mediterrâneo para examinar a diferença entre as duas Áfricas, a árabe e a negra. Seu livro, publicado inicialmente na Inglaterra, sob o título de “Between Niger and Nile” (Oxford University Press, 1965), é quase um trabalho jornalístico. Nele analisa o drama dos povos do continente, em seu esforço por livrar-se do colonialismo e, nos paises já independentes, das suas seqüelas.
No prefácio da edição francesa do livro, redigida em 26 de junho de 1972, três anos antes de morrer, Toynbee afirma que “a mais profunda necessidade da África, e, assim, do mundo, é a de que se revolucione totalmente o coração” do homem. Essa advertência, quase uma prece, cabe em situação não prevista por Toynbee naquele texto: o encontro de Copenhague. Os líderes do mundo estão em um daqueles momentos estudados por Toynbee, nos quais a sobrevivência da civilização depende da coragem de conduzir as mudanças capazes de preservar as conquistas do passado e assegurar o melhor da cultura construída. É disso que se trata. Por mais estejam presentes, na velha Dinamarca, os conselhos da ciência, o problema real está no coração dos homens.
Se fôssemos capazes de examinar a civilização atual com olhos estrangeiros, seria difícil nela encontrar alguma lógica. É uma civilização que rompe com o Humanismo que a fez surgir e que a sustentou, seja em nome da fé, seja contra a fé, durante os últimos vinte e cinco séculos. Muitos defendem a sociedade industrial que surgiu, com o refino do petróleo, há um século e meio, como um benefício fabuloso para o homem. Hoje podemos viajar rapidamente de um continente a outro. Não só vivemos mais tempo, com o progresso da medicina, como vivemos mais no tempo. Os instrumentos de comunicação e as máquinas industriais nos permitem produzir em uma hora mais do que em dias, durante o passado. De repente descobrimos que estamos envenenando a nossa casa e não temos outra disponível.
Os cientistas apontam caminhos para salvar o planeta do aquecimento provocado pela atividade humana. Mas esses caminhos, todos a partir da possibilidade de substituir os combustíveis fósseis por fontes limpas de energia, podem resolver um dos problemas, mas não todos. Temos que encontrar outros módulos para a vida, e isso depende da revolução nos sentimentos do homem, na subversão que sobreponha a solidariedade real, o humanismo real, ao egoísmo que se exacerba na ânsia de lucro do capitalismo contemporâneo.

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