Ainda que muitos dos eleitores de Tiririca o houvessem escolhido para manifestar desprezo e deboche pela política, o seu mandato seria tão legítimo como qualquer outro. Mais de um milhão e trezentos mil cidadãos de São Paulo fazem sua presença na Câmara dos Deputados mais autêntica do que muitas outras, e seu ato foi positivamente político. Pelo que as evidências indicam, ele não comprou votos, nem foi financiado por multinacionais ou grandes bancos.
Se grande parte do eleitorado de São Paulo vota em Paulo Maluf, com o prontuário cívico que se conhece, por que não pode escolher o cidadão Francisco Everardo Oliveira Silva, cearense de Itapipoca, que trabalha desde os oito anos como comediante? Falta-lhe a elaboração intelectual de Chaplin, mas Tiririca não é, nem pretende ser, um gênio como o ator de Luzes da Cidade. Carlos Drummond de Andrade dedica um de seus poemas ao “homem do povo Charles Chaplin”. Carlitos dedicou toda a sua obra ao povo, à democracia e ao humanismo. Espera-se que o desempenho de Tiririca, na Câmara dos Deputados, mereça de um poeta contemporâneo elogio semelhante. Tiririca, torçam o nariz os presunçosos intelectuais e a soberba classe média, é um legítimo homem do povo. Por isso os paulistas o aclamaram, ao receber o diploma de deputado federal no TRE, enquanto o ex-governador Paulo Maluf foi vaiado.
Tiririca estava feliz, ontem, ao participar do primeiro encontro da Comissão de Educação e Cultura. Ele, que não pôde estudar regularmente, compreende a necessidade de bom ensino público. Em razão disso, poderá surpreender com o bom-senso que as dificuldades de vida conferem, e nem sempre as escolas oferecem. Mas a Comissão é também de cultura, e ele é um artista que sabe captar os sentimentos populares e transforma-los em suas cançonetas e em seus bordões humorísticos. Sua cultura é a que vem do chão do Nordeste e da sofrida periferia de São Paulo, cuja humanidade ainda encontra um pouco de alegria nos artistas populares, entre eles, o próprio Tiririca.
Os riscos de guerra
O presidente da Comissão Européia, Durão Barroso, de Portugal, é partidário de uma intervenção militar na Líbia, e, ao que suas declarações indicam, conta com a OTAN. Nos Estados Unidos, apesar das intenções e ameaças belicosas da Sra. Clinton, o Pentágono é mais cauteloso. As forças navais enviadas ao Mediterrâneo, parecem ser apenas intimidatórias. Se os Estados Unidos decidirem criar uma zona de exclusão aérea na Líbia, terão que empregar caças e bombardeiros, com o risco de uma resistência não só das forças de Kadafi, mas também dos rebeldes.
Os europeus, e não só os franceses, parecem mais cautelosos, e com suas razões. Temem uma mobilização geral dos povos árabes, já exaustos das agressões dos paises ocidentais, que não titubearam em apoiar as ditaduras mais sanguinárias, em troca do petróleo. Ainda ontem, um jovem do Kossovo matou dois militares norte-americanos e feriu outros dois, ao atirar contra um ônibus que chegava ao aeroporto de Frankfurt, com os soldados que iriam viajar. Recorde-se que os kossovos sabem do que sofreram, na intervenção da Otan na Iugoslávia, entre outros crimes de guerra, ao serem atingidos por munições radiativas, de urânio empobrecido. Se Kadafi é odiado por parcelas ponderáveis da população, os norte-americanos não são amados.
Há o perigo de a zona inteira transformar-se em campo de resistência armada dos povos árabes, com a interrupção do fornecimento de petróleo. Corre-se também o risco de um incidente com os chineses – muito comum em situações históricas semelhantes. Beijing enviou uma fragata armada ao Mediterrâneo, a fim de defender seus interesses na Líbia e de lá retirar seus cidadãos. Essas duas probabilidades talvez dissuadam os falcões americanos.
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