23 de jan. de 2012

BALTASAR GARZÓN, A JUSTIÇA E A CORRUPÇÃO


(Carta Maior) - Se alguém, ao ler estas notas, lembrar-se de Montesquieu com suas Cartas Persas, e de Tomás Antonio Gonzaga,  que nelas se inspirou, para redigir as Cartas Chilenas, estará fazendo a ilação correta. O assunto nos interessa de perto, assim como o texto do barão de La Brède interessava aos mineiros de Vila Rica daquele tempo. O julgamento, pelo Tribunal Supremo da Espanha, do juiz Baltasar Garzón, é um  exemplo de nossos tempos, nos quais a subversão da lógica e da ética é a mais pavorosa forma de terrorismo. Como no século passado, estamos assistindo aos recados do fascismo, que se reergue, dos subterrâneos da História, para retomar a mesma sintaxe de sempre, que faz do crime, virtude; e,  da dignidade, delito desprezível.
           No passado, era comum a frase esperançosa de que ainda havia juizes em Berlim. Embora ela viesse de uma obra de ficção, é provável que tenha sido autêntica, porque se referia a Frederico II, cuja preocupação para com a equidade da justiça era conhecida, conforme recomendações a seus ministros. Segundo a obra de François Andrieux (Le meûnier de Sans-Souci) e de Michel Dieulafoy (Le Moulin de Sans-Souci), ambos contemporâneos do grande monarca, essa foi a resposta de um moleiro, vizinho ao castelo famoso, quando o soberano, diante de sua recusa  de vender-lhe sua propriedade, ameaçou confiscá-la. O humilde moleiro – talvez confiado na própria conduta habitual de Frederico II, disse-lhe que isso não seria possível, porque ainda havia juízes em Berlim. Havia juízes em Berlim e ainda os há, aqui e ali, mas quando homens como Garzón são submetidos a julgamento – e pelas razões alegadas pelos seus contendores – é de se perguntar se, em alguns lugares, ainda os há. Em alguns lugares, como  em Washington, em que a Suprema Corte de vez em quando espanta os cidadãos, com suas decisões. E em outros lugares.
            Baltasar Garzón surpreendeu a sociedade espanhola,  com sua obstinação na luta contra os que lesam os direitos humanos, o crime organizado, a corrupção no Estado, os delitos dos serviços secretos em suas relações com grupos terroristas. Sua grande vitória, ao obter a prisão, em Londres, do ex-ditador Pinochet e seu posterior julgamento, pela justiça chilena,  fizeram dele uma personalidade mundial. É certo que essa obstinação o transformou em magistrado incômodo. Alguns o vêem com a síndrome do justiceiro enlouquecido,  espécie de Torquemada de hoje. Mas o pretexto que arranjaram para conduzi-lo ao mais alto tribunal da Espanha é, no mínimo, pífio. Garzón, a pedido das autoridades policiais, autorizou a escuta telefônica de algumas pessoas, detidas e em liberdade, com o propósito de impedir a destruição de provas e a continuação de remessas ilegais de dinheiro obtido do erário, ao exterior, e sua “lavagem”, mediante os métodos já denunciados no Brasil.
        Trata-se do famoso caso Gurtel, um entre muitos outros, na Espanha de hoje, em que a presença do franquismo e da Opus dei continua firme. Um grupo de empresários da comunicação e eventos, chefiados por Francisco Correa, intermediava contratos de toda natureza com os governos autônomos e municípios, chefiados pelos homens do  Partido Popular, quando este estava à frente do governo nacional, e que agora retornou ao poder. O grupo  corrompia as autoridades, com presentes, viagens e, sendo necessário,  dinheiro vivo ou depositado na velha Suíça, em nome de políticos e seus laranjas. O dinheiro vinha das empresas candidatas aos bons negócios com o Estado, que “superfaturavam” os  contratos.
                  Os advogados dos bandidos – nessa inversão moral de nossos tempos – conseguiram processar o juiz Garzon, sob a alegação de que as escutas haviam sido ilegais. Ocorre que um juiz, que substituiu Garzón na causa, manteve as escutas e o próprio tribunal de Madri, de segunda instância, confirmou a autorização das interceptações telefônicas. O fato é que o julgamento de Garzón é de natureza política, seja ele um magistrado incorruptível, como é visto pela opinião pública, ou um deslumbrado pela notoriedade, como dele falam os inimigos. E é a inversão da lógica: ele está sendo processado por ladrões.
             Na segunda metade dos setecentos ainda havia juizes em Berlim, de acordo com o modesto moleiro de Potsdam. Resta saber se ainda os há em Madri. E em outros lugares. 


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SANTANDER ECONOMIZA EM MULTA BILIONÁRIA NO BRASIL E PAGA PARA EXECUTIVO RESPONSÁVEL PELA AMÉRICA LATINA APOSENTADORIA DE 161 MILHÕES DE REAIS.


Se os conselheiros do Ministério da Fazenda – e os aposentados do Banespa -  quiserem saber como o Santander está gastando o dinheiro que economizou, depois que foi liberado por unanimidade, no mês de setembro do ano passado, pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, de pagar em impostos atrasados cerca de 4 bilhões de reais, basta  ler a matéria do link que publico abaixo. Parte da fortuna foi para o bolso de Francisco Luzón, o homem do Santander na América Latina, que acaba de se aposentar “voluntariamente”, com um ano de antecedência, levando para casa 70 milhões de euros,  o equivalente a  175 milhões de reais: 

21 de jan. de 2012

A REFORMA DO MINISTÉRIO E AS CRISES POLÍTICAS


(JB) - Getúlio Vargas, que, além de seu reconhecido patriotismo,  se associou ao exercício do poder executivo como nenhum outro governante brasileiro, via seus auxiliares com ceticismo sábio. Raramente os elogiava, a não ser em situações pontuais, se isso era de  interesse político ou administrativo. Sua máxima é conhecida: todo ministério é um ministério de experiência. Os ministros serviam, enquanto bem serviam ao país, em seu critério de chefe. Quando não serviam, individualmente ou em bloco, substituía-os, sem grandes dramas, a não ser para alguns dos dispensados. Como se sabe, o poder é como o amor: dele ninguém se liberta sem algum sofrimento.
            Ninguém consegue governar só, nem mesmo os déspotas mais audazes. Nos sistemas democráticos, ou que assim se identificam, os chefes governam com facções políticas. Essas facções – e sempre foi assim – poucas vezes se formam a partir de escolhas ideológicas sinceras. Organizam-se a partir de razões objetivas, como os interesses econômicos e corporativos, e de sentimentos subjetivos, como os da amizade e do carisma de seus líderes.
        Há, no entanto, os casos, freqüentes na História, de psicopatia política. Alguns gravíssimos, como os de Nero, Calígula, Hitler e Franco; outros ridículos, além de criminosos, como os de Mussolini, Berlusconi, Salazar e os vizinhos Somoza, Pinochet, Stroessner e Trujillo. Isso sem falar em nossa própria realidade, com  Médici, Collor e Jânio Quadros. Mas, nem mesmo Filippo Maria Visconti - o cruel Duque de Milão, tirano em estado puro, como o definiu Elias Cannetti - governava só. Ele, que exerceu o poder de 1412 a 1447, para manter o ducado íntegro,  dependeu de seu chefe militar Francesco Sforza, de quem fez genro e sucessor.
       Os historiadores e analistas das causas e razões do poder se dividem na dúvida permanente: governar é ciência ou  arte? Mesmo os chefes mais intuitivos dependem de um mínimo de conhecimento para o exercício do poder. Os governantes devem saber mandar. Tancredo recomendava aos seus auxiliares pensar antes de dar uma ordem. Deveriam estar certos de que ela seria cumprida, ou seja, de que o subordinado teria condições de executar bem a missão. Saber mandar é saber escolher – mas nem sempre o chefe de governo tem a possibilidade de nomear a pessoa certa para os cargos. Daí o conselho de Vargas: todo ministro vive uma situação precária em seu cargo, uma vez que são demissíveis ad-nutum.
        Discutir, nesse momento de nossa estação histórica, o desconforto da presidente da República em negociar com um parlamento eclético e, em grande parcela, alheio aos interesses do povo brasileiro, é ocioso. Ela só pode administrar a circunstância que  seus antecessores lhe legaram. E isso, queiram ou não os seus opositores atropelados pela realidade, ela vem fazendo com êxito, dentro dos limites do possível.
         Muitos contestam a substituição de tantos ministros que, acusados de corrupção, não puderam, ou não quiseram, defender-se convincentemente dos erros que lhes atribuíam. Esquecem-se de que, mesmo com os escolhos de uma coligação política quase teratológica, ela construiu o governo mediante as consultas com suas bases parlamentares e líderes políticos aptos a recomendar os titulares do Ministério. Tratava-se, como todos os outros, de um ministério de experiência. Nas últimas semanas, antes da reforma recomendada pelo calendário eleitoral, ela pôde reunir informações e confrontá-las com as razões de Estado e suas próprias razões, a fim de reorganizar o Ministério. Que será, sempre como recomenda a inteligência política, de experiência, passível de ser substituído, no todo ou em parte, e em qualquer momento, de acordo com as circunstâncias.     


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17 de jan. de 2012

O BRASIL PRECISA CORRER SE QUISER VIRAR PLATAFORMA DE PRODUÇÃO E EXPORTAÇÃO DO AAKASH

O tablet indiano Aakash, de apenas 45 dólares, vendeu um milhão e quatrocentas mil unidades em apenas 15 dias. Independente dos projetos do BNDES com a Foxconn chinesa, está passando da hora de o governo fazer, ou patrocinar, acordo ou uma joint-venture com fabricantes indianos de tablets de baixo custo, como a Datawind, que fabrica o Aakash, e a Classteacher Learning Systems, que fabrica o Classpad, de uso educacional, para tornar o Brasil produtor e exportador desses artigos para a América Latina. Não podemos continuar trabalhando com a defasagem de anos e anos em áreas estratégicas. Para se ter uma idéia da velocidade com que as coisas estão ocorrendo na Índia, os fabricantes do Aashkash, apenas duas semanas depois de lançar o produto, resolveram construir mais três fábricas para produzi-lo, e elas entrarão em funcionamento dentro de apenas três meses, em abril de 2012.

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16 de jan. de 2012

O PLEITO MUNICIPAL E A AUSÊNCIA DOS CIDADÃOS

(Carta Maior ) - Os próximos meses conduzirão os nossos olhos para dois pontos extremos da razão política: as eleições nos Estados Unidos e o pleito municipal no Brasil. Nos Estados Unidos estaremos atentos às escolhas primárias, com suas tendências, sem a presença da esquerda, mesmo moderada, na disputa. Aqui, a vitória nas cidades indicará os rumos das eleições gerais de 2014.

Ainda que essa realidade se dissimule, o verdadeiro espaço da política é a cidade. É certo que, na estrutura do poder, que concentra as decisões mais importantes e os recursos tributários na União - e, de forma menos decisiva, nos Estados - os municípios são induzidos ao oportunismo. Submetem-se aos partidos e líderes que têm acesso, via parlamento, ao Tesouro Nacional – de onde recebem grande parte do dinheiro dos investimentos e despesas. Em alguns casos, há a renúncia clara em assumir responsabilidades e conduzir os cidadãos à ação efetiva, e em outros, apenas incompetência e conformismo. Essa situação resultou da ação perversora da ditadura burocrático-militar, que teve como sua razão de ser a desmoralização da política e o esmorecimento da cidadania.

Os governos sucessivos, de Castelo a Figueiredo, trataram de corromper as cidades, menores e maiores, com o estímulo aos aventureiros, desprovidos quase sempre de caráter e de conhecimentos, para a disputa de todos os cargos eletivos. Poucos foram os homens honrados que tiveram condições de resistir, e continuaram a fazer política durante o período mais duro da ditadura. Com todas essas dificuldades e as de outros momentos de interrupção do curso natural de nossa História, tem sido difícil a construção da nacionalidade.

Agrava a nossa angústia a evidência de que não estamos sós nesta crise de cidadania. O mundo inteiro cambaleia na perplexidade, com o esvaziamento moral e intelectual das pessoas e, com maior desatino, daquelas escolhidas para legislar, governar – e julgar. A ocupação do Estado pelo neoliberalismo se faz com o controle do poder financeiro, das corporações industriais, dos meios de comunicação e de entretenimento - e das universidades.

Um dado é suficiente: a predominância de títulos de MBA sobre os de PHD, com a transformação dos centros universitários em escolas técnicas de adestramento de gerentes comerciais. É a completa “reificação” das pessoas, sua transformação em coisas, de acordo com a velha constatação humanística. É nesse processo, de alienação continuada da autonomia de pensamento, que a responsabilidade social é substituída, no espírito, pelas imagens coloridas da propaganda, direta e subliminar, que incitam à ambição pessoal de enriquecimento e ao esquecimento da coletividade. Esse esvaziamento da razão coletiva trouxe para o poder rajoys, sarkozys e angelas merkels, depois de bushes, berluscones, aznares e zapateros.

É nesse quadro que as eleições municipais reafirmam sua importância política para o nosso país. É hora de os cidadãos de bem – e não apenas de bens – se reunirem e conversarem, em seus municípios, para a construção das chapas eleitorais de novembro. Não basta que os candidatos – tanto para a Câmara Municipal, quanto para o poder executivo – sejam simpáticos, bons de voto. É possível que um jogador de futebol venha a ser bom político – e o desempenho de Romário, na Câmara dos Deputados, é disso bom exemplo – mas não é sempre provável. Da mesma forma, jovens e charmosos talvez venham a ter desempenho político forte – e nos lembramos de Manuela d’Ávila, que poderá eleger-se prefeita de Porto Alegre, graças a seus méritos - entre eles os de sua reconhecida inteligência e compromissos políticos. Os homens públicos carecem de respeito absoluto ao bem comum e da dedicação real ao seu povo, como nos dois exemplos citados.

A recuperação dos valores políticos municipais vem ocorrendo, a duras penas, nestes últimos vinte anos. Muitos municípios brasileiros se destacaram, apesar das dificuldades, no emprego criterioso dos recursos tributários e no planejamento de suas estruturas físicas e sociais. Isso ocorreu, porque os cidadãos assumiram o seu dever de zelar pelos próprios interesses e pelos interesses gerais do país. Em alguns casos, rebelaram-se, ocuparam as câmaras municipais e as prefeituras, provocaram a ação da justiça, em geral morosa nesses casos, e substituíram os larápios por homens honrados e trabalhadores. Esses municípios não se desmobilizaram, com a vigilância de seus cidadãos, e se tornaram exemplos de como os brasileiros somos capazes de assumir nossas responsabilidades políticas e sociais. Eles têm sido emulados por outros, o que significa uma esperança.

É preciso que os cidadãos se compenetrem de que o município, além de ser a base do sistema federativo, é também a porta de entrada regular para a política – e todo cidadão, por princípio, é político, isso é, responsável pela sua cidade e, em extensão, por seu país. Tudo isso recomenda atenção maior com as eleições municipais deste ano – que servirão para indicar o rumo eleitoral de 2014.

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O GENRO DO REI, OS ‘CABIDES DE EMPREGO” E A PRIVATIZAÇÃO DA TELEFONIA NO BRASIL.


Um dos mais propalados argumentos para se destruir, esquartejar e desnacionalizar as empresas estratégicas nacionais no final dos anos 90, era a deslavada mentira de que elas davam prejuízo ao erário. Esquecem-se de dizer que suas tarifas e investimentos estavam historicamente congelados - entraves que só foram removidos às vésperas da privatização. Outra desculpa era a de que elas se teriam transformado em “cabides de emprego”, o que naturalmente iria acabar após sua venda à iniciativa “privada”.
Quando vieram as licitações, além de terem sido entregues a preço de banana – e muitas vezes com farto e generoso financiamento do próprio governo brasileiro, via BNDES – percebeu-se que, em vez de terem sido privatizadas, muitas dessas empresas haviam sido na verdade re-estatizadas, deixando de ser patrimônio do povo brasileiro, para ingressar na esfera de influência de governos estrangeiros, como o português, o italiano, e o espanhol. Países que, por meio de participação direta ou “golden-shares”, controlavam politicamente – e ainda controlam - a Telecom Italia, a Portugal Telecom ( hoje sócia da OI) e a Telefónica da Espanha.
Abordamos o tema, emblematicamente trágico do ponto de vista da soberania e do desenvolvimento nacionais, não apenas para lamentar a destruição de uma das nossas maiores empresas estratégicas, a Telebrás, e a campanha que estão movendo contra a sua volta, como concorrente pleno, ao mercado brasileiro – no qual as condições de “concorrência”, estabelecidas pela Lei Geral de Telecomunicações, tiveram como maior conseqüência o fato de estarmos pagando, hoje, como já dissemos, algumas das mais altas tarifas do mundo – mas também para mostrar, como, com o nosso dinheiro, estamos enriquecendo parasitas estrangeiros, como é o caso do jogador de handebol e genro do Rei da Espanha, Iñaki Urdangarin, acusado de desvio de dinheiro público. É essa gente - o genro do Rei ganha na Telefónica a bagatela de 1.400.000 euros por ano, mais de 250.000 reais por mês - que ocupa, no Brasil privatizado, os típicos cabides de emprego nos altos escalões das empresas “privatizadas” que sucederam a Telebrás.

Abaixo, o link de matéria saída ontem, no El Pais, sobre Iñaki Urdangarin, o genro do Rei, funcionário da Telefónica Brasil (leia-se Vivo, presidida pelo ex-conselheiro da ANATEL Antônio Carlos Valente), e os seus negócios no Brasil:


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VALE ENFRENTA PROTESTOS EM MOÇAMBIQUE

A Vale – incluída na lista das empresas candidatas ao título de “Pior do Mundo”, a ser conferido pela “Public Eye Awards” - que reúne “ONGs” discutíveis, como a Greenpeace – está enfrentando os protestos dos moradores de Moatize, em Moçambique. A empresa, que explora uma mina de carvão na localidade, desalojou-os de onde moravam, a fim de explorar a jazida, e entregou-lhes novas casas, fora de suas terras, que estão, segundo acusam, em condições precárias. Os manifestantes estão impedindo a circulação de vagões que carregam o produto. Conviria à empresa brasileira buscar uma forma de compensar os desalojados e outros moradores da região, com iniciativas que criassem outros empregos, além dos que oferece nas minas. As atividades agropecuárias, que requerem pouco investimento, seriam uma forma, como já está ocorrendo em outras partes da África, com o concurso da Embrapa. Se as condições aconselhassem, talvez fosse possível estimular o plantio da cana de açúcar e a produção de etanol. A Vale, mesmo privatizada, é uma empresa identificada com o Brasil. Representando o nosso povo, e seus valores, não pode atuar no mundo como qualquer outra multinacional.

13 de jan. de 2012

TEOTÔNIO VILELA E AS PRIVATIZAÇÕES

(JB) - As circunstâncias políticas levaram o governador Teotônio Vilela Filho a inscrever-se no PSDB – assim como muitos outros de seus companheiros de geração. Quando o fizeram, o partido surgia como uma grande esperança de centro-esquerda, animada, ainda, de proclamada intenção de saneamento dos costumes políticos. Provavelmente, se seu pai não tivesse morrido antes, ele, durante o governo do Sr. Fernando Henrique Cardoso, teria mudado de legenda. O intrépido e arroubado patriota que foi Teotônio Vilela pai teria identificado, nos paulistas que, desde então, controlam o partido, os entreguistas que, na herança de Collor, desmantelaram o Estado e venderam, a preços simbólicos, os bens nacionais estratégicos aos empresários privados, muitos deles estrangeiros, e teria aconselhado o filho a deixar aquele grupo.

O PSDB – e, com muito mais inquietação, a ala paulista do partido - se assusta com a hipótese de que a abertura do contencioso das privatizações, a partir das revelações do livro de Amaury Ribeiro Júnior, venha a trazer a punição dos responsáveis, e trata de defender-se. Seus dirigentes não parecem muito preocupados com as vicissitudes de José Serra, que não defendem claramente, mas, sim, com a provável devassa de uma Comissão Parlamentar de Inquérito – uma vez que conseguiram que a primeira investigação se frustrasse.

O partido se vale, agora, do Instituto Teotônio Vilela, para defender a entrega do patrimônio público, e isso constrange os que conheceram de perto o grande alagoano e o seu entranhado patriotismo. Ele, se não estivesse morto, iria exigir que retirassem seu nome da instituição, que nada tem a ver com as suas idéias e a sua luta. Mas ele não é o único morto que teria queixas nesse sentido. Como sabemos, os “democratas” deram o nome de Tancredo ao seu instituto de estudos, quando o grande mineiro sempre se pôs contra as oligarquias e sempre se opôs à Ditadura. Só falta, agora, o Instituto Millenium adotar o nome de Vargas.

A “Carta da Conjuntura”, do PSDB, datada de dezembro último, não se limita a cantar loas a Fernando Collor e a Fernando Henrique. Em redação ambígua, dá a entender que coube a Itamar iniciar o processo de privatização da Vale do Rio Doce, consumada em 1997. Vejamos como está redigido o trecho:

“A transferência paulatina de empresas públicas para o capital privado tornou-se política de governo a partir da gestão Fernando Collor, por meio da implantação do Programa Nacional de Desestatização. Dezoito foram vendidas em sua curta passagem pelo Planalto. O presidente Itamar Franco não retrocedeu e manteve a marcha, privatizando mais 15 companhias. Nesta época, os principais alvos foram as siderúrgicas, como a CSN, a Usiminas e a Cosipa, e as mineradoras, como a então Companhia Vale do Rio Doce (hoje apenas Vale). A Embraer também entrou na lista, no finzinho de 1994.

Ora, é público e notório, para quem viveu aquele tempo – não tão remoto assim – que Itamar reagiu com patriótica indignação contra a privatização da Vale do Rio Doce. Reuniu, em 1997, vários nomes do nacionalismo brasileiro em seu escritório de Juiz de Fora, quando foi redigido – e com minha participação pessoal – um Manifesto contra a medida. Mais ainda: Itamar impediu, como governador de Minas, a privatização da Cemig e de Furnas, como todos se recordam.

Os defensores da privatização usam argumentos que não resistem a um exame combinado da ética com a lógica e a tecnologia. Eles se referem à privatização da telefonia como “a jóia da coroa das privatizações”. A telefonia era, sim, a jóia da coroa do interesse estratégico nacional. E se referem ao aumento e barateamento das linhas telefônicas e dos celulares. A universalização da telefonia e seu custo relativamente baixo, hoje, se devem ao desenvolvimento tecnológico. Com o aproveitamento maior do espectro das faixas de rádio-frequência, a miniaturização dos componentes dos aparelhos portáteis e as fibras óticas – para cuja adequação à telefonia nacional foi decisivo o trabalho desenvolvido pelos técnicos brasileiros da CPQD da Telebrás. Se assim não fosse, os nômades da Mongólia não estariam usando celulares, nem os usariam os camponeses do vasto interior da China, como tampouco os habitantes da savana africana. Como ocorreu no mundo inteiro, o desenvolvimento técnico teria, sim, universalizado o seu uso no Brasil, com a privatização e, principalmente, sem ela.

Tanto é que estamos pagando as mais altas tarifas de telefonia celular e banda larga do mundo, e uma das mais altas em TV a cabo, sem falar na contínua remessa de lucros, que se contam em bilhões de euros, todos os anos, enviadas para acionistas espanhóis, italianos, portugueses, sangria que não existiria, com suas inevitáveis conseqüências para o nosso balanço de pagamentos, se não fossem as privatizações.

Ao ler o texto, lembrei-me dos muitos encontros que tive com Teotônio Vilela, nos seus últimos meses de vida, em São Paulo, no Rio e em Belo Horizonte. Ele lutava com bravura contra o câncer e contra a irresponsabilidade das elites nacionais. A memória daquele homem em que a enfermidade não reduzia a rijeza moral nem o amor ao Brasil – o Brasil dos vaqueiros e dos jangadeiros do Nordeste, dos homens do campo e dos trabalhadores do ABC - me confrange, ao ver seu nome batizando uma instituição capaz de divulgar documentos como esse.

É necessário, sim, rever todo o processo de privatizações, não só em seus aspectos éticos e contábeis, mas também em sua relação com o sentimento nacionalista de nosso povo. Os arautos da entrega alegam, no caso da Vale do Rio Doce, que a empresa tem hoje mais lucros e recolhe mais impostos do que no passado, mas se esquecem de que isso se faz na voraz exploração de nossas jazidas, que jamais serão recuperadas, e sem que haja compensação justa aos municípios e estados produtores.

E há mais: foi o dinheiro brasileiro que financiou a privatização das telefônicas e vem financiando as empresas “compradoras”, como se vê nos repetidos empréstimos do BNDES para sua expansão e fusões, como no caso da Vivo, leia-se Telefônica de Espanha.


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http://midiaglobal.org/?p=49112

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http://www.sechssn.com.br/vernoticia.asp?id=2417

http://fichacorrida.wordpress.com/2012/01/14/no-falta-mais/

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10 de jan. de 2012

QUANDO BANQUEIROS SE TORNAM GANGSTERES

Primeiro ministro da França entre l988 e 1991, Michel Rocard é homem respeitável em seu país. Ele, e um economista mais moço, Pierre Larrouturou, publicaram, segunda-feira, em Le Monde, artigo baseado em fontes americanas sobre os empréstimos concedidos pelo Tesouro dos Estados Unidos aos bancos, em 2008. De acordo com as denúncias – feitas pela agência de informações econômicas Bloomberg – os juros cobrados pelo FED aos bancos e seguradoras foram de apenas 0,01% ao ano, enquanto os bancos estão emprestando aos Estados europeus em dificuldades a juros de 6% a 9% ao ano – de seiscentas a 900 vezes mais. De acordo com as denúncias da Bloomberg, retomadas por Rocard e Larrouturou, o montante do socorro por Bush e Henry Paulson, seu secretário do Tesouro, aos banqueiros, chegou a um trilhão e duzentos bilhões de dólares, em operações secretas.

O artigo cita a cáustica conclusão de Roosevelt, durante sua luta para salvar os Estados Unidos depois da irresponsabilidade criminosa dos especuladores que haviam provocado a Grande Depressão: um governo dirigido pelo dinheiro organizado é igual a um governo dirigido pelo crime organizado.

Dentro do raciocínio de Roosevelt, podemos comparar a carreira de Henry Paulson à de qualquer grande boss de Chicago ou de Nova Iorque no crime organizado. Desde 1974 – quando tinha 28 anos – Paulson tem servido ao Goldman Sachs, a cuja presidência chegou em 1999. Nos sete anos seguintes, ele consolidou a posição do banco em sua atuação internacional – e foi convocado por Bush para ocupar a Secretaria do Tesouro dos Estados Unidos em 2006. Poucos dias antes, ele deixou a presidência do banco, e preferiu converter a indenização a que teria direito (o famoso bônus), em participação acionária. Isso o manteve ligado, por interesse próprio, aos destinos do banco.

Uma das primeiras firmas a serem beneficiadas pela ajuda do Tesouro, por decisão de Paulson, durante a crise de 2008, foi a AIG - a maior seguradora norte-americana - com cerca de 80 bilhões de dólares. Ocorre que o principal credor da AIG, era o Goldman Sachs, que desse dinheiro, recebeu quase 30 bilhões, logo em seguida.

O Goldman foi multado, em julho de 2010, pela SEC (Securities and Exchanche Commission) por fraude, em 550 milhões de dólares, por ter atuado de má fé na questão das operações com papéis da dívida imobiliária. E são ex-diretores do Goldman Sachs (provavelmente ainda grandes acionistas do banco, como é o caso de Henry Paulson) que se encontram agora no controle do Banco Central Europeu (Mario Draghi), na chefia dos governos da Itália (Mario Monti) e da Grécia (Lucas Papademos). O que farão esses interventores do Goldman Sachs, no controle das finanças européias, a não ser defender os interesses dos bancos - e seus lucros fraudulentos? Se Roosevelt fosse vivo, naturalmente estaria pensando em sua advertência dos anos 30.

É brutal a semelhança entre a situação atual e a de 1929. Ao analisar os fatos daquele tempo, John Galbraight disse que “o outono de 1929 foi, talvez, a primeira ocasião em que os homens tiveram, em grande escala, a capacidade de enganar a si mesmos”. A escala do auto-engano parece ser ainda maior em nossos dias. Rocard lembra a observação de Paul Krugman, de que a Europa entrou em uma “espiral da morte” – mas não é apenas a Europa que corre esse risco.

Assim podemos explicar a advertência de Edgar Morin – também citada por Rocard – de que a civilização ocidental está entre a metamorfose e a morte. “O capitalismo sem regras é o suicídio da civilização”, como afirmam Morin e Stephane Hessel, em seu livro recente “Le Chemin de l’espérance”.

O ex-premier Rocard registra, em seu artigo de Le Monde, que as dívidas dos países europeus para com os grandes bancos são antigas, e sua solução não é difícil. Se o Tesouro americano foi capaz de emprestar a 0,01 aos bancos fraudadores e irresponsáveis, o Banco Central Europeu poderia emprestar, com as mesmas taxas, a instituições nacionais européias - seu estatuto veda o empréstimo direto aos estados-membros - como os bancos estatais de fomento e caixas econômicas. Essas instituições repassariam as somas aos estados, cobrando-lhes juros em dobro – a 0,02% ao ano. Se prevalecesse a razão e a ética, estaria resolvido o problema europeu da dívida pública.

Registre-se, no entanto, que o lema do Goldman Sachs, creditado a um de seus antigos controladores, Gus Levy, nos anos 50, é auto-elucidativo: “long-term greedy”, ganância a longo prazo. O fato singelo é o de que, em tempos de crise – como disse Keynes em 1937, e Krugman relembrou também em texto recente – não cabe a austeridade, com corte de gastos sociais e de infraestrutura, mas, sim, é preciso investir e criar empregos. Os governantes de hoje, em sua maioria, não servem a seus povos, e em razão disso, desprezam pensadores como Keynes. Estão a serviço de grandes corporações, dirigidas por fraudadores, como os banqueiros do Goldman Sachs.

Talvez tenhamos que ir mais adiante ainda – e seguir o conselho de Morin: para não perecer, a civilização ocidental terá que sofrer a metamorfose necessária, encasular-se na razão e, nela, criar asas para o vôo.

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A NOVA AMEAÇA DOS ESTADOS UNIDOS

(Carta Maior) - Com as prévias dos republicanos em Iowa, iniciou-se o processo eleitoral norte-americano. Barack Obama não pôde ou não quis cumprir suas promessas de candidato, durante o primeiro mandato. Provavelmente, além do cerco da direita republicana e de seu próprio partido, lhe tenha faltado o carisma, esse atributo necessário aos grandes líderes a fim de mobilizar o povo, sobretudo na sociedade mitológica dos Estados Unidos. O mundo grego foi criado a partir dos deuses e titãs; os Estados Unidos se construíram na eliminação dos nativos e se consolidaram com a invenção dos rangers texanos e dos cowboys da fronteira do sudoeste. A violência é um dos fundamentos da alma norte-americana.

Obama não parecia esculpido desse mesmo barro e poderia ter sido o homem destinado a liderar novo ciclo de esquerda na história norte-americana, como foram os períodos de Jackson, Lincoln, Cleveland, Wilson e Franklin Roosevelt. A realidade demonstrou que, se o povo podia mudar os rumos do país, Obama não conseguiu ser o líder que ele esperava.

Obama não é o melhor para o seu país nem para o mundo, mas seu sucessor republicano – se a direita vencer em novembro – será ainda pior. Mitt Rommey, que ganhou, por pouco, o “caucus” do Iowa e, provavelmente, será vencedor das primárias de New Hampshire, é visto como “moderado”, de acordo com seu desempenho como governador de Massachusetts. No entanto, para agradar ao eleitorado mais conservador, Rommey está se alinhando à extrema direita. Os sinais, com o fraco desempenho do Tea Party, e a divisão dos republicanos, na prévia de Iowa, estão indicando a reabilitação de Barack Obama. Ele pode não ser o melhor, mas qualquer republicano seria pior.

Obama acaba de anunciar a redução dos gastos militares norte-americanos, mas não se trata de alívio para o mundo, e sim, de nova ameaça. O presidente reafirma o velho panfleto do “Destino Manifesto”, ao assegurar que os Estados Unidos, com tal medida, não irão perder a hegemonia, mas, ao contrário, consolidá-la. Parte do projeto – vista como claro desafio aos chineses – é o de aumentar a presença dos Estados Unidos na Ásia. Mas continuarão a exercer sua influência na América Latina, e a usar mais recursos tecnológicos e menos homens nos combates e na ocupação. Em suma, pretendem usar armas de destruição em massa teleguiadas, como as bombas-voadoras recentemente testadas, robôs manejados do Pentágono para a ocupação de áreas “inimigas”, guerra no ciberespaço, mais espionagem ainda,operações clandestinas para a eliminação de adversários no exterior e, embora não esteja explícita, a guerra biológica. As linhas básicas são as de “combate ao terrorismo” e de proibição do acesso à tecnologia nuclear e outras.

O projeto, do Secretário de Defesa, pode parecer efetivo, mas, do ponto de vista estratégico, é menos convincente. O que determina a ocupação militar é o pé do soldado, e o que consolida a vitória é a conquista política dos povos inimigos. Essa conquista política, apesar dos embasbacados admiradores do american way of life, parece descartada no horizonte histórico.

Para nós, latino-americanos, asiáticos e africanos, o que importa é a resistência à auto-arrogada hegemonia de Washington, com o retorno ao velho princípio da autodeterminação dos povos e da não intervenção nos assuntos internos dos países soberanos. No caso do Brasil, é necessário reafirmar a necessidade de fortalecimento de nossa capacidade de defesa, da qual nos descuidamos por falta de recursos durante o fim do governo militar e durante o governo Sarney, e por opção capitulacionista de Collor e Fernando Henrique.

Todos os esforços de qualquer nação se dirigem a um objetivo comum: o de garantir a soberania contra a agressão militar e as pressões diplomáticas do exterior. O Brasil é um dos países que menos gastam com a defesa e, por isso mesmo, vulnerável a um ataque estrangeiro, pelo menos no primeiro momento. É certo que a potencialidade do país para rechaçar qualquer invasão é imensa, tendo em vista sua dimensão territorial e o patriotismo de seu povo, que não de suas elites. É verdade que grande parte da sociedade, ainda traumatizada pelo regime militar, vê com reservas o fortalecimento das Forças Armadas. É preciso, sim, promover seu profissionalismo, retomar as pesquisas tecnológicas e incentivar os compromissos nacionalistas de seus quadros, afastando-os de perniciosas influências estrangeiras. Devemos gastar o que for necessário para prepará-las para o pior – o que é sempre uma eventualidade.

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9 de jan. de 2012

ECONOMIA: BOLETIM FOCUS ERRA OUTRA VEZ, POR UMA PEQUENA “MARGEM” DE MAIS DE 200 %.



Terminado o ano de 2011, o Brasil alcançou quase 30 bilhões de dólares de superávit em seu comércio externo, o maior nos últimos quatro anos, com o crescimento de 47% sobre o resultado do ano anterior – com volume de negócios de quase 500 bilhões de dólares.

Se alguém voltar à previsão do Boletim Focus, em dezembro de 2010, para o comércio externo em 2011, irá verificar que os “magos” do sistema financeiro previam o saldo de pouco mais de 9 bilhões e quinhentos milhões de dólares. Erraram por pouco, apenas pela “pequena” margem de 20 bilhões de dólares - mais de 200% sobre seus cálculos.

Um equívoco de dois, três por cento, ou, de, no máximo dez por cento seria aceitável, embora surpreendente, tratando-se de tão altos luminares. Mas errar por essa margem, e continuar sendo consultados, como se nada tivesse ocorrido, é um insulto à inteligência da nação.

Embora todas as previsões do “mercado” se baseiem não exatamente em fatos, mas na opinião pessoal dos chamados analistas, não era difícil prever o aumento do preço das commodities no início do ano de 2011. Nada indicava abrupta queda do ritmo da demanda chinesa, cada vez mais voltada para o atendimento de seu imenso mercado interno em expansão, e, logo, menos dependente do que está acontecendo na Europa e nos Estados Unidos. Se a demanda chinesa não diminuiu na crise de 2008, por que isso se daria em 2011 ou por que ocorrerá – a não ser que haja uma catástrofe, natural ou política – neste ano de 2012. Deduz-se que o ritmo da economia chinesa cresça acima de 9% nestes doze meses.

O Banco Central surgiu, em 1964, subordinado à ideologia do primeiro governo militar, o de Castelo Branco. Foram seus criadores intelectuais Roberto Campos e Otávio Gouveia de Bulhões, embora o projeto de sua criação viesse de Vargas, visto como importante para a soberania nacional. A idéia de Getúlio era a de que os bancos privados deveriam ser submetidos aos freios do Estado, e esses freios seriam manejados pela instituição que pretendia. Não conseguiu criá-lo por causa da oposição dos banqueiros paulistas, e dos acadêmicos monetaristas, liderados por Eugenio Gudin, que pretendiam um “banco central independente”. O Bacen nasceu assim submetido ao fetiche do “mercado” financeiro, uma vez que criado por economistas neoliberais (já então), como foram Bulhões e Roberto Campos, ambos pupilos diletos de Gudin, para quem a industrialização do país era um erro, e deveríamos ser apenas o velho país “essencialmente agrícola”. Bulhões e Campos foram francos defensores do capital estrangeiro. E ferozes inimigos da criação e manutenção da Petrobrás. Campos chegou a sugerir que a Petrobrás fosse chamada de Petrossauro.

Por isso, em lugar de reservar aos seus técnicos a elaboração dos estudos de previsão dos rumos da economia, a fim de orientar seu próprio comportamento e a ação do governo, o Bacen “ouve” o mercado. Ora, o mercado não fala: falam os seus operadores, interessados apenas nos próprios negócios. É de sua conveniência prever situação negativa para as finanças públicas, a fim de justificar o aumento de juros que o Tesouro , mediante a taxa Selic, paga aos bancos, e orienta as operações de crédito com comércio, a indústria e os cidadãos. Daí as estimativas, quase sempre furadas, do Boletim Focus, que, em todo o início de ano, passam a ser amplamente divulgadas pelos meios de comunicação, como verdades incontestáveis. Essas “profecias”, baseadas no “mercado” – incapaz de perceber, em qualquer lugar do mundo, o surgimento de crises, como a de 29 e as atuais - corroem a credibilidade do Banco Central, e deveriam estar sendo discutidas amplamente, pelos jornais, pelo Congresso e toda a sociedade brasileira. O mercado não existe como pessoa de direito. E isso faz lembrar a famosa resposta de Geisel, quando o advertiram de que deveria “ouvir o sistema”: o único sistema que conhecia era o sistema métrico decimal, que não fala. O mercado não opina, nem fala. Quem opina e fala são os seu agentes.

O Banco Central nesta nova administração não é o mesmo do passado, quando esteve sob a presidência do banqueiro Henrique Meirelles. A reversão da tendência de alta futura da SELIC já demonstrou que seus novos dirigentes – e o governo como um todo - não vão mais se submeter, dóceis, a esse tipo de pressão. A Nação não pode permitir que meia dúzia de usurários determine quanto devem pagar de juros os que trabalham e produzem.

Talvez fosse melhor acabar de vez com o Boletim, que só tem servido para dar fé aos maus augúrios das cassandras.

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5 de jan. de 2012

O PRÉ-SAL EM UM MUNDO SEM PETRÓLEO E AS FORÇAS ARMADAS

(JB) - Há décadas que a exaustão dos mananciais de petróleo vem sendo anunciada. O assunto foi dos mais discutidos pelo Clube de Roma, que pretendia deter o desenvolvimento econômico do mundo, com o congelamento do progresso e o crescimento zero. Os argumentos eram poderosos: como os recursos do planeta são finitos, infinito não pode ser o seu consumo, e o modelo de vida deve ser mudado. Ocorre que os países ricos – que promoveram o encontro e soaram o alarme – pretendiam congelar o tempo: os que se encontravam à frente, à frente continuariam, enquanto os outros, não podendo desenvolver-se, pelo acordo pretendido, regrediriam. A reação dos países em desenvolvimento, com o apoio então da URSS, tornou o projeto inviável.

A partir da Conferência de Estocolmo, em 1972, a preocupação com o meio ambiente passou a ser, sobretudo, dos países em desenvolvimento, que apontaram as razões reais da crise: a civilização do desperdício imposta ao mundo pelos países ricos. A partir de então, os países centrais aceleraram o seu esforço a fim de controlar as fontes de matéria prima, sobretudo do petróleo, no mundo inteiro, com o emprego da diplomacia e da guerra. Essa ofensiva foi possível mediante a aliança entre Reagan, Thatcher e o Vaticano, com a cumplicidade de Gobartchev, contra o sistema socialista - que apoiava os esforços do Terceiro Mundo.

Uma das artimanhas do poder imperial é a desinformação. Com relação à energia - além do petróleo, o urânio e terras raras - essa desinformação é patente: tenta esconder o entendimento entre os países ricos para o controle direto das atuais jazidas, que se exaurem rapidamente. Não se preocupam com a poluição do mundo, nem com o chamado efeito estufa: seu cuidado é o de manter a posição hegemônica. Nessa atitude, os Estados Unidos, os países europeus e os chineses continuam a proclamar a intenção de encontrar saídas para proteger o ambiente da vida, enquanto continuam em seu processo poluidor, não só em seus territórios nacionais, mas no mundo inteiro – conforme a atuação de suas empresas na África, na Ásia e na América Latina.

As grandes empresas petrolíferas – que mantêm influência poderosa nos governos dos países centrais, de forma direta, ou mediante o Clube de Bilderberg – escondem as previsões assustadoras de que as reservas petrolíferas do mundo chegarão ao seu pico nos próximos três anos, e se iniciará o processo de exaustão, calculado em 5% ao ano - nos termos atuais de consumo. Se essa previsão se confirmar, em 20 anos as atuais reservas estarão esgotadas, se o consumo não aumentar, o que reduziria o prazo previsto.

Um dos sinais das dificuldades a vir é o malogro do grande campo de Kachagan, nas águas sob a jurisdição do Casaquistão, no Mar Cáspio. A província petrolífera de Kachagan era uma das maiores promessas de grande produção. As reservas são calculadas entre 9 e 16 bilhões de barris. O início da produção estava previsto para daqui a dois anos – em 2014. Dificuldades técnicas e dificuldades econômicas se alternam. É preciso trabalhar em condições extremas, com a temperatura variando de 35 graus abaixo de zero, no inverno, a 40 graus acima de zero, no verão. As condições são de tal maneira duras que os trabalhadores da região protestaram, em dezembro, de forma vigorosa contra as condições de trabalho impostas pelas empresas Total, da França; Shell, da Holanda e do Reino Unido; Exxon, dos Estados Unidos, e Eni, da Itália. Foram reprimidos à bala pelo governo do Casaquistão, com pelo menos dez mortos. Houve deliberado silêncio sobre o incidente.

Com toda a pujança do campo de Kachagan, suas reservas totais dariam apenas para o consumo mundial, nos níveis atuais, de três meses (na previsão mais baixa, de 9 bilhões de barris) a menos de seis meses (na hipótese de 16 bilhões). O Cáspio era a grande miragem dos Estados Unidos e seus aliados europeus, e a verdadeira razão da guerra movida contra o Afeganistão, assim como a verdadeira razão da guerra contra o Iraque sempre foi o petróleo. Embora haja ainda a possibilidade de outras jazidas, de menor expressão, de petróleo e gás na região, a grande expectativa, a de Kachagan se frustra. Diante dos obstáculos, os investidores se afastam do projeto, e as empresas envolvidas começam a planejar a retirada, mas se encontram presas ao contrato com o governo do Casaquistão, e esse contrato termina em 2041 – com a transferência para o país das instalações da grande ilha artificial montada pelas contratantes.

O petróleo continua sendo a mais importante das matérias primas, enquanto a ciência não lhe encontrar sucedâneos. A advertência de que a contagem para a sua exaustão já se inicia deve ser meditada em nosso país. Estamos eufóricos com as perspectivas das jazidas encontradas sob a camada de sal no litoral atlântico. Há hoje uma disputa entre estados e municípios para o dispêndio de parcela dos resultados dessa exploração, por via dos royalties. Isso se houver realmente royalties, uma vez que, se não prevalecer a emenda Pedro Simon, os royalties a serem pagos pelas empresas exploradoras serão a elas devolvidos em óleo.

Temos também que usar desses recursos, se eles corresponderem ao que esperamos, para financiar pesquisas nacionais em busca de fontes alternativas de energia e, com a mesma preocupação, do fortalecimento de nossos exércitos. No que se refere às Forças Armadas, é urgente restabelecer a indústria nacional de armamentos, abandonada pelo derrotismo interessado dos neoliberais brasileiros. Essa atitude capitulacionista quase nos custou a entrega total da Petrobrás às sete irmãs bastardas, que são as principais petroleiras do mundo. O balanço objetivo do que foi o governo Fernando Henrique poderá ser realizado com a CPI das Privatizações, a ser constituída em breve.

O mundo que temos à frente não nos promete a paz – a menos que sejamos capazes de agir decisivamente contra o sistema atual, dominado por meia dúzia de meliantes, que controlam os governantes, a maioria deles pessoas medíocres e subornadas pelos grandes bancos, que também controlam as grandes corporações multinacionais. As manifestações de massa do ano que passou podem ter sido apenas fogo de palha. Falta organizar politicamente o inconformismo, em cada um dos países do mundo, a fim de assegurar aos seres humanos os direitos que lhes são naturais, e que se resumem em viver, enquanto vida houver, sem medo e sem ódio.

4 de jan. de 2012

O MENINO E O LIXO

(Carta Maior) - Este deve ser o conto de natal de nossos tempos. Os dois meninos foram catar material reciclável no lixão de Campo Grande, capital do Mato Grosso do Sul. Uma das maquinas empurrou a massa de detritos, para fazer espaço – e os soterrou. Um deles, mais ágil, conseguiu escapar. Maikon Correa de Andrade, de nove anos, ficou sob o lixo, e seu corpo foi encontrado muitas horas depois pelos bombeiros.

Maikon deve ser um dos milhares de máicons que receberam esse nome em homenagem a Michael Jakson, porque é assim que alguns ouvidos registram o nome do ídolo. Um dia, a mãe de Maikon deve ter sonhado destino de riqueza e de glória para o filho, e, nessa esperança, dado ao recém-nascido o nome de uma estrela. Maikon não sabia cantar, não sabia dançar – e talvez nem soubesse catar alguma coisa que prestasse no meio do lixo. Ele poderia ter pisado em uma agulha de seringa e se ter contaminado de alguma doença fatal, como já ocorreu a muitos. Mas poderia ter encontrado alguma coisa ainda precariamente servível, como um brinquedo jogado fora. Ou, apenas, teria recolhido restos de metal, fios de cobre, coisas de estanho e chumbo, para serem vendidos a intermediários, e destinados à reciclagem. Se Maikon conseguiu alguma coisa, não a tinha em suas mãos, rijas depois de tantas horas já mortas.

A morte de Maikon é um conto de Natal, sem a ternura dos relatos de Dickens ou de Mark Twain – mas é também a parábola negra do novo liberalismo triunfante. Somos uma sociedade que se dedica a produzir lixo. As mercadorias que chegam ao mercado são, quase todas elas, lixo. Começamos com a embalagem – e essa civilização pode ser considerada a “civilização da embalagem” – tanto mais inútil quanto mais sofisticada. A essência da mercadologia – ou do marketing, se preferirmos – é a embalagem, trate-se de manteiga ou de candidatos a cargos eletivos; trate-se de hospitais ou de calistas. Todos os produtos, que a embalagem embeleza, são também lixo em sursis: concebidos para durar pouco. A idéia da reciclagem, fora a dos metais, é recente. Trata-se de um escamoteio da consciência, a de que o meio ambiente pode ser preservado com esse expediente esperto do capitalismo.

O mundo produziria menos lixo, se a idéia do lucro não prevalecesse sobre a idéia da vida. Assim, é o próprio capitalismo, em sua essência, que deve ser discutido. A mesma desrazão que produz o lixo material, produz o que sua lógica considera o lixo humano – os seres descartáveis que o senso estético e prático burguês rejeita. Os pobres são seres instrumentais, como as ferramentas que enferrujam, e, uma vez sem serventia, pelo uso e pelo tempo, devem ser jogadas fora. Sua reciclagem se faz nos filhos, que podem ser usados.

Maikon foi sepultado no lixo em que buscava a sobrevivência antes que cumprisse o destino do pai e, provavelmente, do avô. Morrendo tão cedo, frustrou o destino que provavelmente o esperava. Nada mais natural que Maikon, que morava em um bairro miserável de Campo Grande – ironicamente batizado com o nome do primeiro bispo e arcebispo da cidade, Dom Antonio Barbosa – se misturasse, aos nove anos, com os resíduos dos bairros ricos.

Mas, e se Maikon não tivesse ido ao lixão nesses dias entre o Natal e o Ano Novo, quando há presépios toscos mesmo nas casas pobres, e quando se celebra a vinda de Cristo e o início de mais uma volta da Terra em torno do Sol – o que poderia ocorrer em seu futuro? Como outros meninos, não muitos, mas alguns, ele talvez viesse a driblar o destino, crescer e deixar uma forte presença no mundo. Não era de se esperar - mesmo com a tentativa desnecessária dos evangelistas em lhe conferir progênie divina e ancestralidade nobre - que aquele menino nascido em uma gruta de Belém, viesse a dividir o mundo em duas eras. Afinal, ele, nascido na estrada, era de Nazaré – e se dizia, em seu tempo, que de Nazaré nada chegava de bom a Jerusalém.

Mesmo com o estranho nome de Maikon, o menino de Campo Grande era ainda um enigma, quando morreu sufocado pela sujeira da cidade rica. Toda criança encerra, em si mesma, a dialética do futuro. Maikon poderia vir a ser um traficante de fronteira, ou um grande homem, nas artes ou na ciência. É nesse profundo mistério que se sepultou seu destino. O corpo, resgatado do lixo, voltou ao barro de que todos nós viemos, ricos e pobres, orgulhosos uns, humilhados outros.

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