A menos que haja um terremoto de oito
pontos na escala Richter, ou os céus derramem de novo o dilúvio – e desta vez
só sobre São Paulo -Fernando Haddad
deverá ser eleito hoje prefeito da maior cidade do Hemisfério Sul.
O ex-ministro da Educação não é ainda
uma figura carismática da política, mas sendo homem jovem, não lhe foi difícil
comunicar-se com a população. Homem de boa formação, soube dialogar com os
auditórios de classe média e, não sendo de postura arrogante, tampouco teve
dificuldades em conversar com os que sofrem na periferia. Além disso, a
candidatura de seu adversário, fora outras dificuldades, arrastava o fardo da
administração Kassab. Os paulistanos queriam mudança.
A cidade de São Paulo é, em si mesma,
realidade política própria – pela densa população, pela identidade cultural, e
pela economia que, há quase cem anos, é
a mais importante da federação. Os poderes de fato da grande cidade raciocinam
com pragmatismo e, em certo momento da campanha do primeiro turno, perceberam
que não deviam ver o candidato do PT como ameaça aos seus interesses. Contra os
seus interesses, sim, seria a eventual vitória de Russomano, comparável a uma
caixa preta indevassável.
É certo que esses poderes não decidem,
por eles mesmos, uma eleição desse porte, mas ao reduzirem seu apoio a Serra –
que já iniciara a corrida com os pés amarrados a uma rejeição pesada –
favoreceram, de alguma maneira o candidato do PT. Essa postura se deve à
circunstância de que, nas duas vezes em que o Partido dos Trabalhadores
administrou a cidade – com Luísa Erundina e com Marta Suplicy – seu desempenho
foi excelente. Com todos os problemas crônicos da cidade, que se explicam no
mau planejamento do passado e a conseqüente expansão urbana desordenada, e a
manifestação aguda dessas dificuldades - sobretudo com as enchentes, apagões e
violência -, o PT agiu com zelo e prudência quando governou a capital. Essa
prudência e esse zelo contrastam com os últimos oito anos de governo dos
tucanos, que transformaram São Paulo em uma cidade inabitável, conforme
denunciam os mais conhecidos e respeitáveis intelectuais brasileiros, que redigiram e
assinaram o manifesto em favor de Haddad - que pode ser lido nesta Carta Maior.
Como se sabe, e o Manifesto destaca, o programa de governo de Haddad nasceu dos
encontros com a população e com ela foi discutido exaustivamente. Seu propósito
é o de devolver São Paulo ao humanismo e ao sentimento de solidariedade de
todos para com todos os seus habitantes.
Esse passado a ser corrigido, somado às
condições conjunturais da política, deu impulso à candidatura proposta por
Lula. Houve também o convencimento político de Marta e de Erundina, de que não
podiam fazer da presença do tempo de televisão de Maluf a razão para entregar a
Serra a prefeitura. As duas engoliram em seco o que lhes pareceu demasia, e
ajudaram a campanha, exatamente ali onde seus conselhos são mais ouvidos: na
periferia.
Tempos novos pedem homens novos. Estas
eleições são as primeiras que se disputam sob a vigência da Ficha Limpa. E, ao
contrário do que muitos temiam, o julgamento da Ação 470, pelo STF, em nada
influiu sobre o comportamento dos eleitores. Em todos os lugares, em que ganhou
e perdeu e em que ganhará ou perderá hoje, o PT esteve e está sujeito ao seu
desempenho próprio na circunscrição eleitoral em questão. Os eleitores,
ao contrário do que, de um lado e do outro, podem pensar candidatos e partidos,
está, sim, aprendendo a votar de acordo com os seus interesses e os interesses
da comunidade.
Por tudo isso, pela sua gestão como
Ministro da Educação, em que atuou decididamente para levar os pobres à
Universidade, e mais o prestígio de Lula
e Dilma, o que não é pouco, Haddad deve ganhar, e com folga, as eleições de
hoje em São Paulo.
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Um comentário:
Uma análise simplesmente primorosa!
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