5 de dez. de 2012

JUSTIÇA É COISA SÉRIA


          (JB) -   Vamos deixar a um canto o julgamento da Ação 470. Trata-se de um fato consumado. Ao julgar os réus daquele processo, o Supremo Tribunal Federal passou a ser julgado – não pelos meios de comunicação, que o têm aplaudido; não pelos setores da classe média do Sul e do Sudeste, que se sentem ressarcidos moralmente, com a condenação de correligionários de um apedeuta nordestino, operário metalúrgico, que conseguiu eleger-se e governar o país. Para todos esses, o Supremo foi o Areópago dos tempos míticos, com os juízes sob a presidência, invisível, mas infalível, da deusa Atena. Mas há quem examine as  a situação com outros olhos.
             O jornalista mineiro José das Dores Vital acaba de publicar um ensaio delicioso, “Como se faz um bispo”, mostrando o jogo que se esconde na escolha de um novo prelado na hierarquia católica. As revelações do Ministro Luis Fux, publicadas no fim de semana pela Folha de S. Paulo, sobre os seus esforços a fim de se tornar Ministro do STF, sugerem um best-seller, como o  de Vital.
           Seria muito interessante mostrar como se escolhem alguns dos mais elevados magistrados da República. Muitos deles, pelo que andam anunciando, pretendem ser os arcontes do Estado Nacional, e pairar sobre todos os seus poderes, assentados no monte de Ares (ou de Marte, em latim), dedicado ao deus da guerra. 
            Fux conta como pediu a Deus, e a todo  mundo, que o indicassem para ocupar uma vaga no Supremo: de João Pedro Stédile, do MST, a Delfim Neto, incluindo José Dirceu e outros réus da Ação 470 que ele, Fux, julgaria. Segundo a Folha de S. Paulo, um seu emissário, em seu nome, solicitou ao jornal que ele fosse ouvido. E foi muito bem entrevistado, por uma das mais argutas e ferinas jornalistas brasileiras, Mônica Bérgamo.
           Diz o juiz que ficou “estarrecido” com as provas contra Dirceu e os outros e, assim, votou pela condenação dos réus. Estarrecidos estamos todos nós, com as suas revelações. Fosse ele um juiz de tempos mais antigos, é provável que se declarasse suspeito e se eximisse de participar do julgamento. Não por se sentir tentado a absolver, por gratidão; mas, sim, por se sentir tentado a condenar exatamente por ter sido ajudado. Há uma desconfiança universal e muito antiga de que muitos, ao receber um favor, passam a odiar quem os ajuda. Não se trata de uma regra, mas, sim, de  exceções. Não para Ulysses Guimarães que dizia: o dia do benefício é a véspera da ingratidão.
       Há dois mecanismos mentais que explicam esse paradoxo. Um deles é a soberba do favorecido, sobretudo nas indicações políticas. O outro é o  de compensação do sentimento de humilhação do imaturo ao  pedir o favor ao poderoso - tão mais forte a ponto de lhe conceder o pedido. No primeiro caso, o ajudado passa a acreditar que não foi escolhido como um favor, mas sim, pelo reconhecimento de seus méritos. “Ele só podia me ter escolhido, porque, dentre todos os outros,  só eu sou capaz”.
       Assim também poderia pensar Fux, embora  seu confessado pranto de regozijo, junto ao Ministro da Justiça,  não sugira essa espécie de sentimento. Resta o outro - o do constrangimento pela súplica do apoio. Se o juiz Fux condenou os réus com a convicção de julgador, ou não, importa pouco, nesta fase do processo. O que qualquer cidadão pode condenar é a forma pela qual ele e outros foram escolhidos. Que um candidato a qualquer cargo peça apoio, é natural – mas deve preservar um pouco de decoro em sua postulação. Lula, submetido a duras provas pessoais nos últimos meses, ao aprovar o nome de Fux junto a Dilma, não soube desconfiar  de quem trazia indicações tão amplas, que provinham de todas as direções ideológicas. Em Minas, a idéia é a de que aquele que tem a recomendação de todos não tem recomendação alguma.
        O passado de um candidato ao STF deve ser examinado ao microscópio. Os juízes do Supremo Tribunal são a última instância na defesa das pessoas contra o Estado e na defesa do Estado contra seus inimigos. Eles devem ser personalidades de indiscutível probidade, mas, da mesma forma, mostrar o saber necessário para atuar com toda a isenção possível. Os juízes não são anjos vingadores,  celebridades do showbusiness,  nem  cúmplices dos criminosos. São, ou devem ser, cidadãos acima dos interesses e das paixões, para  assegurar a todas as pessoas justas o direito à vida, na segurança da paz. É preciso encontrar critérios mais rigorosos, transparentes e universais, para a indicação e aprovação, pelo Senado, dos Ministros do STF.

Este texto foi publicado também nos seguintes sites:


http://www.jb.com.br/coisas-da-politica/noticias/2012/12/04/justica-e-coisa-seria/























8 comentários:

  1. Caro sr. Santayana, veja o que um "metido" escreveu sobre seu artigo na TI.: merece uma resposta sua, a altura;

    http://www.tribunadaimprensa.com.br/?p=54359#comments

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  2. Não merece não, José. O que essa gente quer é isso, atenção. Se a gente der, eles ficam felizes da vida. Os fatos estão aí, e respondem, por si sós, a esse tipo de coisa. Obrigado pela lembrança, e pela informação. Um forte abraço,

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  3. Pois eu fui lá, e fiz o seguinte comentário:

    Eu quero saber é quando que o STF, tão impoluto, vai julgar o MENSALÃO do PSDB mineiro, que a grande mídia prefere, quando é obrigada a lembrá-lo, chamar de Mensalão “mineiro” “tout court”, crime cometido seis anos antes do Mensalão sobre o qual se assanham os nobres comentaristas, e quando vão ser julgados os outros 190 processos contra políticos de diversos partidos que se acumulam nas gavetas do STF, como publicou, com documentos, a Carta Capital há algumas semanas. È isso que eu quero saber. Quantos anos de cadeia vai dar o STF para o Sr. Eduardo Azeredo, primeiro contratante e cliente do Sr. Marcos Valério. Ladrões há em todos os partidos, tanto é que basta ver que o campeão dos fichas-sujas nas últimas eleições foi o PSDB, e não o PT. O mínimo que se espera de um Supremo Tribunal é que ele trate todo mundo com isonomia, que não acelere o julgamento de determinados processos em detrimento de outros, e que quebre o pau, se tiver que quebrar, em cima de todo mundo, porque pau que dói em João, também tem que doer em Eslebão.

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  4. Concordo com o seu artigo, mas não seria o caso dos Ministros Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski se considerarem impedidos tambem?

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  5. Se eles estão julgando a quem pediram indicação, sim.

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  6. Muy bueno tu blog y estoy siguiendo su cargo por un largo tiempo!

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