(JB) - Vamos deixar a um canto o julgamento da Ação 470.
Trata-se de um fato consumado. Ao julgar os réus daquele processo, o Supremo
Tribunal Federal passou a ser julgado – não pelos meios de comunicação, que o
têm aplaudido; não pelos setores da classe média do Sul e do Sudeste, que se
sentem ressarcidos moralmente, com a condenação de correligionários de um apedeuta nordestino, operário
metalúrgico, que conseguiu eleger-se e governar o país. Para todos esses, o
Supremo foi o Areópago dos tempos míticos, com os juízes sob a presidência,
invisível, mas infalível, da deusa Atena. Mas há quem examine as a situação com outros olhos.
O jornalista mineiro José das
Dores Vital acaba de publicar um ensaio delicioso, “Como se faz um bispo”, mostrando o jogo que se esconde na escolha
de um novo prelado na hierarquia católica. As revelações do Ministro Luis Fux,
publicadas no fim de semana pela Folha de
S. Paulo, sobre os seus esforços a fim de se tornar Ministro do STF,
sugerem um best-seller, como o de Vital.
Seria muito interessante mostrar como se
escolhem alguns dos mais elevados magistrados da República. Muitos deles, pelo
que andam anunciando, pretendem ser os arcontes do Estado Nacional, e pairar
sobre todos os seus poderes, assentados no monte de Ares (ou de Marte, em
latim), dedicado ao deus da guerra.
Fux conta como pediu a Deus, e a todo mundo, que o indicassem para ocupar uma vaga
no Supremo: de João Pedro Stédile, do MST, a Delfim Neto, incluindo José Dirceu
e outros réus da Ação 470 que ele, Fux, julgaria. Segundo a Folha de S. Paulo, um
seu emissário, em seu nome, solicitou ao jornal que ele fosse ouvido. E foi
muito bem entrevistado, por uma das mais argutas e ferinas jornalistas
brasileiras, Mônica Bérgamo.
Diz o juiz que ficou “estarrecido”
com as provas contra Dirceu e os outros e, assim, votou pela condenação dos
réus. Estarrecidos estamos todos nós, com as suas revelações. Fosse ele um juiz
de tempos mais antigos, é provável que se declarasse suspeito e se eximisse de
participar do julgamento. Não por se sentir tentado a absolver, por gratidão;
mas, sim, por se sentir tentado a condenar exatamente por ter sido ajudado. Há
uma desconfiança universal e muito antiga de que muitos, ao receber um favor,
passam a odiar quem os ajuda. Não se trata de uma regra, mas, sim, de exceções. Não para Ulysses Guimarães que dizia:
o dia do benefício é a véspera da ingratidão.
Há
dois mecanismos mentais que explicam esse paradoxo. Um deles é a soberba do
favorecido, sobretudo nas indicações políticas. O outro é o de compensação do sentimento de humilhação do
imaturo ao pedir o favor ao poderoso - tão
mais forte a ponto de lhe conceder o pedido. No primeiro caso, o ajudado passa
a acreditar que não foi escolhido como um favor, mas sim, pelo reconhecimento de
seus méritos. “Ele só podia me ter escolhido, porque, dentre todos os outros, só eu sou capaz”.
Assim também poderia pensar Fux,
embora seu confessado pranto de regozijo,
junto ao Ministro da Justiça, não sugira
essa espécie de sentimento. Resta o outro - o do constrangimento pela súplica
do apoio. Se o juiz Fux condenou os réus com a convicção de julgador, ou não,
importa pouco, nesta fase do processo. O que qualquer cidadão pode condenar é a
forma pela qual ele e outros foram escolhidos. Que um candidato a qualquer
cargo peça apoio, é natural – mas deve preservar um pouco de decoro em sua postulação.
Lula, submetido a duras provas pessoais nos últimos meses, ao aprovar o nome de
Fux junto a Dilma, não soube desconfiar de quem trazia indicações tão amplas, que
provinham de todas as direções ideológicas. Em Minas, a idéia é a de que aquele
que tem a recomendação de todos não tem recomendação alguma.
O passado de um candidato ao STF deve
ser examinado ao microscópio. Os juízes do Supremo Tribunal são a última
instância na defesa das pessoas contra o Estado e na defesa do Estado contra
seus inimigos. Eles devem ser personalidades de indiscutível probidade, mas, da
mesma forma, mostrar o saber necessário para atuar com toda a isenção possível.
Os juízes não são anjos vingadores, celebridades
do showbusiness, nem cúmplices dos criminosos. São, ou devem ser, cidadãos
acima dos interesses e das paixões, para
assegurar a todas as pessoas justas o direito à vida, na segurança da
paz. É preciso encontrar critérios mais rigorosos, transparentes e universais, para
a indicação e aprovação, pelo Senado, dos Ministros do STF.
Este texto foi publicado também nos seguintes sites:
Este texto foi publicado também nos seguintes sites:
http://www.jb.com.br/coisas-da-politica/noticias/2012/12/04/justica-e-coisa-seria/
8 comentários:
Caro sr. Santayana, veja o que um "metido" escreveu sobre seu artigo na TI.: merece uma resposta sua, a altura;
http://www.tribunadaimprensa.com.br/?p=54359#comments
Não merece não, José. O que essa gente quer é isso, atenção. Se a gente der, eles ficam felizes da vida. Os fatos estão aí, e respondem, por si sós, a esse tipo de coisa. Obrigado pela lembrança, e pela informação. Um forte abraço,
Pois eu fui lá, e fiz o seguinte comentário:
Eu quero saber é quando que o STF, tão impoluto, vai julgar o MENSALÃO do PSDB mineiro, que a grande mídia prefere, quando é obrigada a lembrá-lo, chamar de Mensalão “mineiro” “tout court”, crime cometido seis anos antes do Mensalão sobre o qual se assanham os nobres comentaristas, e quando vão ser julgados os outros 190 processos contra políticos de diversos partidos que se acumulam nas gavetas do STF, como publicou, com documentos, a Carta Capital há algumas semanas. È isso que eu quero saber. Quantos anos de cadeia vai dar o STF para o Sr. Eduardo Azeredo, primeiro contratante e cliente do Sr. Marcos Valério. Ladrões há em todos os partidos, tanto é que basta ver que o campeão dos fichas-sujas nas últimas eleições foi o PSDB, e não o PT. O mínimo que se espera de um Supremo Tribunal é que ele trate todo mundo com isonomia, que não acelere o julgamento de determinados processos em detrimento de outros, e que quebre o pau, se tiver que quebrar, em cima de todo mundo, porque pau que dói em João, também tem que doer em Eslebão.
Concordo com o seu artigo, mas não seria o caso dos Ministros Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski se considerarem impedidos tambem?
Se eles estão julgando a quem pediram indicação, sim.
Muito bom o post
muito bom os seus post!
Muy bueno tu blog y estoy siguiendo su cargo por un largo tiempo!
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