(JB)-Nota-se uma diferença de linguagem na reação do governo
brasileiro à ampla invasão do sistema de comunicações de nosso país pelos
serviços secretos norte-americanos. A presidente Dilma Rousseff, ainda que
ponderada, foi muito mais incisiva do que o chanceler Antonio Patriota.
O
ministro chegou a elogiar a disposição do Departamento de Estado em nos prestar
esclarecimentos, pelas vias diplomáticas – como se isso fosse uma concessão do
poderoso, e não uma prática da diplomacia clássica. Não se trata de verberar
sua atitude, e menos ainda, de louvá-la, mas, sim, de entendê-la: Patriota tem
notória simpatia pelos Estados Unidos, onde foi embaixador, antes de assumir a
Secretaria-Geral do Itamaraty, e é casado com uma cidadã norte-americana.
A cada dia nos surpreendemos por novas
revelações da intromissão de Washington em nossos assuntos internos. Poucos
países do mundo sofreram ingerência direta dos ianques tanto quanto o Brasil.
Eles souberam controlar os grandes meios de comunicação no Brasil. E como não
conseguem guardar segredos, hoje se sabe que, no cerco contra Getúlio Vargas e
a Petrobrás, em 1954, editoriais violentos dos grandes diários do Rio foram
redigidos na Embaixada dos Estados Unidos, em inglês, e traduzidos ao português
por jornalistas pagos pelos serviços secretos norte-americanos.
A sua participação na mal-explicada
renúncia de Jânio e no posterior golpe de 1964 é hoje um fato histórico bem
documentado. O homem-chave em seu planejamento e execução foi o general Vernon
Walters, amigo de Castelo Branco, e a mais enigmática figura dos serviços norte-americanos
de inteligência, e que foi oficial de ligação do V Exército com a FEB, na
campanha da Itália. Walters participou do golpe contra Mossadegh, no Irã,
esteve no Vietnã depois do golpe no Brasil, e, entre outros cargos, foi diretor
da CIA e embaixador na Alemanha.
O momento é delicado, uma vez que a
presidente Dilma Rousseff deverá realizar uma visita de Estado a Washington em outubro próximo. Essa visita era
vista – diante de alentadores sinais do Departamento de Estado – como o início
de um novo relacionamento entre os dois países, com o reconhecimento de nosso
direito a uma diplomacia livre de orientações e de tutela, o que, de alguma
forma, já ocorria, desde o início do governo Lula, em 2003.
Pressionada por todos os lados, a chefe de
Estado está compelida a cumprir o programa, que não se fará sem natural
constrangimento das duas partes. Outros fossem os tempos, e governantes -como
foram Juscelino, Jânio e Itamar - e o Brasil protelaria, se não cancelasse de
vez, a viagem programada para daqui a escassos três meses.
Apesar
da conjuntura difícil, o Brasil não pode reagir com timidez. Sua postura terá
de ser firme, sem bravatas, mas de forma conseqüente. Um dos passos
recomendáveis seria a denúncia dos acordos de cooperação na área de
inteligência do combate ao narcotráfico – sempre um canal disponível para
outros tipos de informação, entre eles os da vigilância de nossas fronteiras.
Devemos deixar claro o nosso protesto,
com medidas efetivas.
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