(JB)-Entre as diferentes hipóteses de resposta à espionagem da
Presidente da República e de seus ministros e assessores, aventa-se a possibilidade
– segundo afirmam os meios de comunicação, teria sido suspenso o envio da
delegação precursora – do cancelamento da viagem de Dilma Roussef aos EUA, no
mês que vem.
Pensando fria e estrategicamente, esta pode não ser a opção
mais adequada para enfrentar o problema. Ao deixar de comparecer a uma visita
de Estado, mesmo que em previsível gesto de protesto, o Brasil estaria abdicando
de mostrar ao mundo que procura ter com os Estados Unidos uma relação à altura.
Estaríamos, guardadas as devidas proporções e circunstâncias,
agindo como o governo golpista de Federico
Franco, que, ao tentar – de maneira inócua - reagir contra a suspensão do
Paraguai do Mercosul por quebra de suas salvaguardas democráticas, resolveu votar
contra a vitoriosa eleição de representantes brasileiros na OMC e na Comissão
Interamericana de Direitos Humanos.
Muito mais efetivo seria se, no âmbito dos BRICS, Dilma obtivesse de nossos parceiros
russos, chineses, indianos e sul-africanos, o compromisso de se trabalhar, coordenada
e aceleradamente, no desenvolvimento de uma BRICSnet.
Uma rede de internet para o grupo, alternativa e paralela à que
foi criada pelos Estados Unidos e que permanece sob estrito controle dos
norte-americanos. Um sistema que contasse com avançados programas criptográficos
que embaralhassem a informação entre origem e destino, impedindo que ela fosse decifrada pelas
agências de inteligência dos EUA.
Segundo o analista geopolítico Eric Drauster, entrevistado pela
edição espanhola do Russia Today esta semana, o grande alvo da espionagem
norte-americana – e isso está claro no caso brasileiro – são os BRICS, como a
única aliança capaz de rivalizar com o bloco EUA-União Européia nos planos
político, estratégico e econômico nos próximos anos, e essa mesma premissa vale
para o campo das redes globais de comunicação instantânea.
A China possui, hoje, tecnologia de ponta na área de
telecomunicações, a ponto da Huawei ter
sido impedida de trabalhar nos EUA, pelo Congresso dos Estados Unidos, sob a
suspeita – olhem só quem está falando – de que seus equipamentos fossem usados
para espionar os norte-americanos.
A Índia, com centenas de milhares de programadores formados,
todos os anos, nas mais avançadas linguagens da engenharia da computação,
dispõe de um verdadeiro exército para o desenvolvimento de softwares e chaves criptográficas virtualmente imunes à
bisbilhotice da CIA ou da NSA.
Juntos, Rússia, China, Índia, Brasil e África do Sul
poderiam, se quisessem, em menos de um ano, espalhar uma rede de cabos
submarinos da BRICSnet unindo seus respectivos continentes sem que esses
equipamentos passassem, como acontece hoje, pelo território dos EUA.
Uma rede de satélites de comunicação da BRICSnet também
poderia ser desenvolvida e lançada em curto espaço de tempo – quem sabe como o
primeiro projeto a ser financiado pelo banco de infraestrutura dos BRICS - nos
moldes de outros programas já existentes, como o CBERS, o Programa de Satélites
China-Brasil de Recursos Terrestres.
Uma aliança na BRICSnet entre desenvolvedores indianos e a
manufatura chinesa, com a colaboração de russos, brasileiros e sul-africanos,
seria praticamente imbatível no desenvolvimento e venda, para os países emergentes
– só o Grupo BRICS representa mais de 40% da população do mundo – de novos serviços de email, redes sociais, navegadores,
sistemas de exibição e distribuição de vídeos e música, sistemas operacionais
para tablets e telefones inteligentes, tudo desenvolvido à margem das empresas
ocidentais que hoje colaboram, prestimosamente, com os serviços de espionagem
dos Estados Unidos.
A Presidente Dilma, poderia, sim, fazer sua visita de Estado
aos Estados Unidos. É importante que ela
escute as explicações – se houver e forem dadas – do Presidente Barrack Obama,
que pode ter lá seus problemas com a área de inteligência, como temos aqui, de
vez em quando, com a nossa.
Mas é muito mais importante, ainda, que ela discurse no
jardim da Casa Branca, dizendo na cara dos norte-americanos, e diretamente ao próprio
Presidente Barrack Obama, que a nenhum país foi dado o direito de tutelar os
outros em assuntos de segurança.
Que o Brasil, assim como outros grandes países, não delegou a
ninguém a licença de defendê-lo no mundo.
Que somos uma nação soberana que não aceita ser monitorada, sob
nenhum pretexto, por quem que seja.
E que a comunicação entre países e entre pessoas não pode –
em defesa justamente da liberdade e da democracia – ficar, sob nenhuma
hipótese, a cargo de um único estado, por mais que esse estado acredite em
mandato divino ou destino manifesto.
Este texto foi publicado também nos seguintes sites:
http://dilmanarede.com.br/ondavermelha/blogs-amigos/uma-rede-para-os-brics
Este texto foi publicado também nos seguintes sites:
http://dilmanarede.com.br/ondavermelha/blogs-amigos/uma-rede-para-os-brics
4 comentários:
Prezado Santayana,
Eu tenho grande consideração por suas análises e o considero uma das pessoas mais lúcidas deste país, mas discordo amplamente de suas colocações. Sou Doutor em Engenharia Eletrônica e tenho algum conhecimento de causa. Gostaria de chamar sua atenção para a citação de apenas dois países que têm algo a oferecer: China e Índia. Em uma parceria, todas as partes devem ganhar, então o que o Brasil têm a oferecer à China, a Índia ou a Rússia? Tecnologia? Nós não temos nenhum poder militar, alguns ingênuos podem dizer que tempos comida e água, mas a China já têm a África. Na sua proposta vamos cair nas mãos da China e da Índia.
A solução para o Brasil é investir maciçamente em ciência e tecnologia, inclusive reinventando a roda, de forma independente. Devemos reformular nossas forças armadas, extirpando a influência americana,e equipando-a com armas de ponta desenvolvidas localmente, com componentes nacionais, inclusive com armas nucleares, desta forma, teremos algo para trocar e poderio para sermos respeitados.
Parabéns sr. Mauro, um abraço Hiago e Reinaldo.
Obrigado pelas sugestões. Minha opinião sobre defesa pode ser vista pesquisando o tema aqui no blog, e coincidem com as suas. O que não podemos é reinventar a roda, e o que proponho é a troca do Ocidente, por uma parceria com os BRICS nesse sentido. Dizer que o Brasil não tem tecnologia é relativo. A EMBRAER fabrica aviões na China, e as lentes das câmeras dos satélites que lançamos com a China são desenvolvidas aqui mesmo, no Brasil. Um abraço para todos, e obrigado, Hiago e Reinaldo.
Prezado Santayana,
A Embraer desenvolve aviões, sim. Mas quem são os fabricantes dos motores? Quem são os fabricantes de mais 80% dos aviônicos? Os aviônicos são exemplos típicos onde os brasileiros não tem acesso a várias tecnologias, portanto, para termos independência, devemos reinventar, assim como a marinha fez com as ultra-centrífugas (a reinvenção saiu melhor que a original). Os discursos da reinvenção da roda e investir apenas nos diferenciais competitivos são discursos extremamente perigosos pois são usados para manter a situação como está.
Mais uma vez, parabéns pelo artigo.
Um abraço.
Postar um comentário