30 de abr. de 2015

A CRIPTOGRAFIA E O AUTORITARISMO





(Hoje em Dia) - Apresentando-se, sempre, ao mundo, como um paladino da defesa da liberdade e da democracia, os EUA acabam de pedir à comunidade científica o fim da criptografia, processo que permite aos usuários de computador defender seus dados de hackers e mantê-los a salvo de estados abusivos e autoritários, que espionam seus cidadãos e os alheios, como o é o caso dos próprios Estados Unidos.

Na última conferência RSA, voltada para sistemas de segurança cibernética, encerrada há poucos dias, o Secretário para a Segurança Interna dos EUA, Jen Johnson, fez um apelo aos técnicos e cientistas participantes, no sentido de desenvolver uma forma definitiva de “contornar e desabilitar a criptografia” como forma de aumentar o poder dos órgãos de segurança.

O caminho mais fácil para que isso venha a ocorrer já está delineado. O rápido avanço da computação quântica, possibilitará o surgimento de um novo tipo de computador, contra o qual a maioria dos softwares criptográficos não teriam a menor defesa. 

Há no entanto, países e organizações que, antevendo a ameaça que esse tipo de máquina poderia acarretar contra a liberdade individual, se organizam para incentivar o desenvolvimento de novos tipos de criptografia capazes de proteger dados no futuro universo da computação quântica, antes mesmo que os computadores quânticos estejam desenvolvidos.

Ressabiada pela espionagem executada contra alguns de seus dirigentes, como a Chanceler Ângela Merkel, a União Europeia não parece estar disposta a aceitar de braços cruzados a consolidação de um imenso Big Brother  planetário, por parte do governo norte-americano, não nos moldes do reality show imbecil homônimo, mas da ditadura descrita no profético romance 1984, de George Orwell, que lhe emprestou o nome.

A Comissão Europeia acaba de liberar milhões de euros para que cientistas desenvolvam sistemas criptográficos imunes a computadores quânticos, no que já está sendo chamado de criptografia “pós-quântica”. Qualquer dado que tenha de ser protegido em um horizonte de mais de dez anos, já teria de ser guardado por esse sistema, já que esse é o tempo previsto para entrada em funcionamento, nas mãos dos governos mais avançados, da computação quântica.

O Brasil, cujo governo também foi vítima da espionagem norte-americana, deveria se juntar a esse esforço, em colaboração com a UE, ou financiando pesquisas semelhantes dentro de universidades como a USP.

Os EUA alegam ser necessário eliminar a criptografia para se defender de “terroristas” e criminosos.

A questão é saber quem, no futuro, irá determinar quem é “terrorista” e quem é um combatente lutando, eventualmente, contra estados fascistas com tecnologia de localização pessoal, reconhecimento facial, dados biométricos, espionagem de massa de telecomunicações e de internet.

Em nome da Liberdade, essa prerrogativa não deve ser do Sistema, mas, primordialmente, do indivíduo.



26 de abr. de 2015

A PETROBRAS E O "DOMÍNIO DO BOATO".






(Jornal do Brasil) - Os jornais foram para as ruas, na última semana, dando como favas contadas um prejuízo de 6 bilhões de reais na Petrobras, devido a casos de corrupção em investigação na Operação Lava a Jato. Seis bilhões de reais que não existem. E que foram colocados no “balanço”, como os bancos recorrem, nos seus, a provisões, por exemplo, para perdas com inadimplência, que, quando não se confirmam, são incorporadas a seus ativos mais tarde.


Não há - como seria normal, aliás, antes de divulgar esse valor - por trás destes 6 bilhões de reais, uma lista de contratos superfaturados, dos funcionários que participaram das licitações envolvidas, permitindo que se produzissem as condições necessárias a tais desvios, dos aditivos irregularmente aprovados, das contas para as quais esse montante foi desviado, dos corruptos que supostamente receberam essa fortuna.


O balanço da Petrobras, ao menos quanto à corrupção, foi um factoide. Um factoide de 2 bilhões de dólares que representa o ponto culminante de uma série de factoides produzidos por um jogo de pressões voltado para encontrar, doa a quem doer, chifre em cabeça de cavalo.


Houve corrupção na Petrobras? Com certeza, houve.


Houve necessariamente superfaturamento e prejuízo com a corrupção na Petrobras?


Isso é preciso provar, onde, quando e como.


E o pior de tudo, é que a maior empresa brasileira apresentou esses resultados baseada, e pressionada, por uma questionável “auditoria”, realizada por uma, também, discutível, companhia estrangeira.


Segundo divulgado em alguns jornais, a empresa de auditoria norte-americana  PricewaterhouseCoopers teria feito uma série de exigências para assinar, sem ressalvas, o balanço da Petrobras, estabelecendo um patamar para a perda com “impairment” e corrupção muito maior que a real, com base, nesse último aspecto, não em dados e informações, mas em números apresentados inicialmente por delatores, tomados como verdade indiscutível, quando vários destes mesmos delatores “premiados” negaram, depois, em diversas ocasiões, peremptoriamente, a existência de superfaturamento.


Essa é uma situação que, se fosse reconhecida no balanço, lançaria por terra a suposta existência de prejuízos de bilhões de dólares para a Petrobras com os casos investigados na Operação Lava a Jato, e ainda mais na escala astronômica em que esses números foram apresentados.


Que autoridade e credibilidade moral e profissional tem a PricewaterhouseCoopers para fazer isso?


Se a Petrobras, não tivesse, premida pela necessidade de responder de qualquer maneira à situação criada com as acusações de corrupção na empresa, sido obrigada a contratar empresas estrangeiras, devido à absurda internacionalização da companhia, iniciada no governo FHC, nos anos 90, e, no caso específico da corrupção, tivesse investigado a história da PwC, que contratou por milhões de dólares para realizar essa auditoria pífia - que não conseguiria provar as conclusões que apresenta - teria percebido que a PwC é uma das principais empresas responsáveis pelo escândalo dos Luxemburgo Leaks, um esquema bilionário de evasão de impostos por multinacionais norte-americanas, que causou, durante anos, um rombo de centenas de bilhões de dólares para o fisco dos EUA, que está sendo investigado desde o ano passado; que ela é a companhia que está por trás do escândalo envolvendo a Seguradora AIG em 2005; que está relacionada com o escândalo de fraude contábil do grupo japonês Kanebo, ligado à área de cosméticos, que levou funcionários da então ChuoAoyama, parceira da PwC no Japão, à prisão; com o escândalo da liquidação da Tyco International, Ltd, no qual a  PricewaterhouseCoopers teve de pagar mais de 200 milhões de dólares de indenização por ter facilitado ou permitido o desvio de 600 milhões de dólares pelo Presidente Executivo e o Diretor Financeiro da empresa; com o escândalo da fraude de 1.5 bilhão de dólares da Satyam, uma empresa indiana de Tecnologia da Informação, listada na NASDAQ; que ela foi também acionada por negligência profissional no caso dos também indianos Global Trust Bank Ltd e DSK Software; e também no caso envolvendo acusações de evasão fiscal do grupo petrolífero russo Yukos; por ter, em trabalho de auditoria, feito exatamente o contrário do que está fazendo no caso da Petrobras, tendo ficado também sob suspeita, na Rússia, de ter acobertado um desvio de 4 bilhões de dólares na construção de um oleoduto da Transneft; que foi acusada por não alertar para o risco de quebra de empresas que auditava e assessorava, como a inglesa Northern Rock, que teve depois de ser resgatada pelo governo inglês na crise financeira de 2008; e no caso da JP Morgan Securities, em que foi multada pelo governo britânico; que está ligada ao escândalo da tentativa de privatização do sistema de águas de Nova Délhi, que levou à retirada de financiamento da operação pelo Banco Mundial; e que também foi processada por negligência em trabalhos de auditoria na Irlanda, país em que está sendo acionada em um bilhão de dólares.


Enfim, a  PricewaterhouseCoopers é tão séria - o que com certeza coloca em dúvida a credibilidade de certos aspectos do balanço da Petrobras - que, para se ter ideia de sua competência, o  Public Company Accounting Oversight Board dos Estados Unidos encontrou, em pesquisa realizada em 2012, deficiências e problemas significativos em 21 de 52 trabalhos de auditoria realizados pela PwC para companhias norte-americanas naquele ano.


É este verdadeiro primor de ética, imparcialidade e preparo profissional, que quer nos fazer crer - sem apresentar um documento comprobatório - que de cada 100,00 reais gastos com contratações de 27 empresas de engenharia e infraestrutura pela Petrobras, 3,00 tenham sido automaticamente desviados, durante vários anos, como se uma empresa com aproximadamente 90.000 funcionários funcionasse como uma espécie de linha de montagem, para o carimbo automático, de uma comissão de 3%, em milhares de notas a pagar, relativas a quase 200 bilhões de reais em compras de produtos e serviços.


Desenvolveu-se, no Brasil, a tese de que, para que haja corrupção, é preciso que tenha havido, sempre, necessariamente, desvio e superfaturamento.


Há empresas que fornecem produtos e serviços a condições e preço de mercado, quem nem por isso deixam de agradar e presentear com benesses que vão de cestas de natal a computadores o pessoal dos departamentos de compra e outros funcionários de seus clientes.


Há outras que convidam para encontros e viagens no exterior os médicos que receitam para seus pacientes medicamentos por elas fabricados. E outras, ainda, que promovem - ou já promoveram no passado - em outros países, congressos para funcionários públicos, como prefeitos, deputados e membros do Judiciário.


O montante ou o dinheiro reservado para esse tipo de “agrado” - que, moralmente, para alguns, não deixa de ser também uma espécie de tentativa de corrupção - depende, naturalmente, do lucro que vai ser aferido pela empresa em cada negócio, e do tamanho e potencial de investimento e gasto do cliente que está sendo atendido.


Em depoimento na CPI da Petrobras esta semana, o ex-dirigente da empresa ToyoSetal, Augusto Mendonça Neto, afirmou que pagamentos foram feitos a Paulo Roberto Costa e a Renato Duque, responsáveis pelas diretorias de Refino e Abastecimento e de Serviços, não para que eles alcançassem um determinado objetivo - manipulando contratos e licitações, por exemplo - mas para que não prejudicassem as empresas, já que, em suas palavras: “o poder que um diretor da Petrobras tem de atrapalhar era enorme. De ajudar, é pequeno. Na minha opinião, eles vendiam muito mais dificuldade do que facilidade. Na minha opinião, as empresas participavam muito mais por medo do que por facilidades. ”


Outro delator - devido, talvez, à impossibilidade de provar, inequivocamente, contabilmente, juridicamente, o contrário - o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, já havia voltado atrás, em petição apresentada no dia 9 de abril à Justiça - corroborando afirmações das próprias empreiteiras envolvidas - afirmando que as obras investigadas na Operação Lava a Jato não eram superfaturadas, e que as comissões de 3% eventualmente recebidas eram retiradas do lucro normal das empresas e não de sobrepreço, negando que ele e Alberto Youssef tenham recebido listas com as obras e empresas que seriam vencedoras em cada licitação.  “Isso nunca aconteceu”, disse o seu advogado, João Mestieri, à Folha de São Paulo.


A mesma coisa já tinha sido explicada, didaticamente, em depoimento à CPI da Petrobras, pelo  ex-gerente de implementação da Refinaria Abreu e Lima, Glauco Colepicolo Legatti, no dia 31 de março, ocasião em que negou que tivesse recebido propina, que tivesse qualquer conta no exterior, que tivesse feito transferência recente de qualquer bem para parentes, dando a entender também que poderia colocar seu sigilo bancário à disposição caso necessário.


Legatti negou peremptoriamente que tenha havido superfaturamento nas obras da refinaria, explicou o aumento dos custos da obra devido a adequações de projeto e a características como ser a mais avançada e moderna refinaria em construção no mundo, com uma concepção tecnológica especialmente desenvolvida que permite a inédita transformação de 70% de cada barril de petróleo bruto em óleo diesel, e que ela produzirá, quando terminada, 20% desse tipo de combustível consumido no Brasil - “não tem superfaturamento na obra. Superfaturamento é quando digo que algo custa 10 e vendo por 15. Aqui são custos reais incorridos na obra. Não tem um centavo pago que não tenha um serviço em contrapartida. Não existe na refinaria nenhum serviço pago sem contrapartida ”, afirmou.


Compreende-se a necessidade que a Petrobras tinha de “precificar” o mais depressa possível a questão da corrupção, admitindo que, se tivesse havido desvios em grande escala, estes não teriam passado, no máximo, como disseram dois delatores "premiados", inicialmente, de 3% do valor dos contratos relacionados ao “cartel” de empresas fornecedoras investigadas.


Mas com a aceitação da tese de que houve desvio automático desse mesmo e único percentual em milhares de diferentes contratos sem comprovar, de fato, absolutamente nada, sem determinar quem roubou, em qual negócio, em que comissão, em que contrato, em qual montante, a Petrobras e a PricewaterhouseCoopers levaram os jornais, a publicar, e a opinião pública a acreditar, que realmente houve um roubo de 6 bilhões de reais na Petrobras, que gerou um prejuízo desse montante para a empresa e para o país.


Isso é particularmente grave porque, para as empresas, a diferença entre a existência ou não de sobrepreço, significa ter ou não que pagar bilhões de reais em ressarcimento, no momento em que muitas estão praticamente quebrando e que tiveram vários negócios interrompidos, devido às consequências institucionais da operação que está em andamento.


Para se dizer que houve um crime, é preciso provar que tipo de crime se cometeu, a ação que foi desenvolvida, quem estava envolvido e as exatas consequências (prejuízo) que ele acarretou.


Até agora, no Caso Lava a Jato - que inicialmente era cantado e decantado como envolvendo quase 90 bilhões de reais - não se chegou a mais do que algumas centenas de milhões de dólares de dinheiro efetivamente localizado.


O que não quer dizer que tudo não tenha de ser apurado e punido, até o último centavo.


Essa determinação, que é de toda a sociedade brasileira, não consegue, no entanto, esconder o fato de que, ao inventar, sob pressão de alguns setores da mídia, da opinião pública e da justiça, o instituto da corrupção plural e obrigatória, com percentual tabelado, prazo determinado em número redondo de anos e meses, para início e fim das atividades, em operações que envolvem milhares de contratos de 27 diferentes empresas, a Petrobras e a Price criaram uma pantomímica, patética e gigantesca fantasia.


Pode-se colocar toda a polícia, promotores e juízes que existem, dentro e fora do Brasil, para provar, efetivamente, esse fantástico roubo de 6 bilhões de reais, investigando contrato por contrato, comissão de licitação por comissão de licitação, entrevistando cada um de seus membros, procurando apenas provas lícitas, cabais e concretas, como transferências reais de dinheiro, contas no exterior em bancos suíços e paraísos fiscais, quebra de sigilo telefônico, imagens de câmeras de hotéis e restaurantes, indícios de enriquecimento ilícito, interrogatórios e acareações, ressuscitando e dando vida aos melhores detetives de todos os tempos, de Sherlock Holmes a Hercule Poirot, passando pelo Inspetor Maigret, Nero Wolfe, Sam Spade, Phillip Marlowe, a Miss Marple de Agatha Cristie e o frade William de Baskerville de “O Nome da Rosa”, que não se conseguiria provar - a não ser que surjam novos fatos - que houve esse tipo de desvio na forma, escala, dimensão e montante apresentados no balanço da Petrobras há poucos dias.


Delações premiadas - nesse aspecto, já desmentidas - podem ser feitas no atacado, afinal, bandido, principalmente quando antigo e contumaz, fala e inventa o quer e até o que não quer.


Mas até que se mude de planeta, ou se destruam todos os pergaminhos, alfarrábios e referências e tratados de Direito, sepultando a presunção de inocência e o império da prova e da Lei no mesmo caixão desta República, toda investigação tem de ser feita, e os crimes provados, individualmente.


Com acuidade, esforço e compenetração e sem deixar margem de dúvida.


Todos os crimes, e não apenas alguns.


À base de um por um, preferencialmente.


Com o processo do “mensalão” do PT - o único dos “mensalões” julgado até agora - inaugurou-se, no Brasil, a utilização da teoria do Domínio do Fato, de forma, aliás, absolutamente distorcida, como declarou, a propósito desse caso, o seu próprio criador, o jurista alemão ClausRoxin.


Ele afirmou, em visita ao país, na época do julgamento da Ação penal 470, que “ não é possível usar a teoria do “Domínio do Fato” para fundamentar a condenação de um acusado supondo sua participação apenas pelo fato de sua posição hierárquica. “A pessoa que ocupa a posição no topo de uma organização tem também que ter comandado esse fato, emitido uma ordem inequívoca” - afirmando que o dever de conhecer os atos de um subordinado não implica em co-responsabilidade.


“A posição hierárquica não fundamenta, sob nenhuma circunstância, o domínio do fato”, comentando que “na Alemanha temos o mesmo problema. É interessante saber que aqui também há o clamor por condenações severas, mesmo sem provas suficientes. O problema é que isso não corresponde ao Direito. O juiz não tem que ficar ao lado da opinião pública”. “Quem ocupa posição de comando tem que ter, de fato, emitido a ordem. E isso deve ser provado”.


O que quis dizer Claus Roxin com isso? Que, para que haja “domínio do fato’, é preciso comprovar, de fato, que houve esse fato.


Com a saída meramente "aritmética" usada no balanço da Petrobras, baseada em uma auditoria de uma empresa estrangeira que, na realidade, pelos seus resultados, parece não ter tecnicamente ocorrido, inaugura-se, no Brasil, para efeito do cálculo de prejuízos advindos de corrupção, uma outra anomalia: a “teoria do domínio do boato”.

25 de abr. de 2015

O SENTIDO DA PÁTRIA





(Hoje em Dia) - O dia 7 de setembro, assim como o dia 21 de abril, deveria nos lembrar Tiradentes, e outros heróis que o antecederam e sucederam, e que, como ele, deram sua vida pela ideia de construir, no sul da América, a grande nação de que falava o alferes.

Os heróis de Massangano e Guararapes, das guerras contra os franceses e os holandeses, gente que, aqui, não defendia a metrópole portuguesa, mas a terra em que tinha nascido, nossas praias, selvas montanhas e planícies, o sangue de seus pais e o destino de seus filhos.

Os que lutaram na Serra dos Palmares, na Balaiada, na Cabanagem, na Revolta dos Malês, na Guerra de Independência.

Os que pereceram defendendo o seu direito a um mínimo de pão e dignidade, em Canudos e no Contestado.

Os que lutaram pela Liberdade e pela Democracia, nos campos e montanhas da Europa, em Monte Castello, Castelnuovo, Collecchio, Montese e Fornovo di Taro.

Os que lutaram pela soberania nacional, como Getúlio e Juscelino, e pela volta do estado de direito, combatendo e perecendo nas trevas da tortura e dos porões, até o fim da ditadura, com as campanhas da Anistia, das Diretas Já, e da eleição de Tancredo Neves, que também morreria em um 21 de abril, antes de tomar posse como presidente da República.

Deveríamos, todos, escutar o eco do alferes, que reverbera nos túneis espiralados da história, como um momento singular da nossa formação.

Há quem ataque a figura de Joaquim José da Silva Xavier. Há quem diminua seu papel na Conjuração Mineira, que mais tarde inspiraria a independência e os ideais republicanos, ao longo do século que se seguiu à sua morte.

São dúvidas e contradições, até certo ponto, subjetivas, e interessam mais aos historiadores do que ao homem comum.

O que importa é que as nações, como as pessoas, são forjadas e crescem por meio de episódios e personagens que marcam sua evolução futura, e inspiram o surgimento de outros heróis, que se unem para sintetizar o sentido da Pátria, ligando o ontem e o amanhã, e projetando a glória, a soberania e a honra que são o amálgama dos povos e de seus territórios.

Isso é verdade, pelo menos, para aqueles que amam o chão em que vieram ao mundo, e que são capazes de se sacrificar por algo mais do que o seu próprio conforto, riqueza e a parte que conseguirem de certo tipo de felicidade, fugaz e superficial, neste mundo.

Para outros, os egoístas, os céticos, os que fazem questão de se manter odiosos e ignorantes, os que se embasbacam por outras nações e bandeiras, nenhum herói, ou sua projeção, fará diferença.

Esses venderiam o país por um carro mais confortável, mesmo que fosse feito lá fora, sem gerar um miserável emprego aqui dentro, ou por um litro de gasolina mais barata, feita por uma empresa estrangeira, do outro lado do planeta, mesmo que a indústria de óleo e gás seja responsável por 13% do PIB do Brasil, quinto maior país em extensão territorial e população e sétima maior economia do mundo.

23 de abr. de 2015

A ÁFRICA E A TRAVESSIA DA MORTE





(Do Blog) - A "Primavera" Árabe, fomentada pelos EUA e pela União Europeia, com suas intervenções no Oriente Médio e no Norte da África, continua pródiga em produzir cadáveres, em fecunda safra, trágica e macabra.

Morre-se nas mãos do Exército Islâmico, que começou a ser armado para tirar do poder inimigos de Washington, como Kaddafi e Bashar Al Assad. Morre-se nas cidades destruídas da Síria, da Líbia e do Iraque. Morre-se no deserto, ou à beira mar, na fuga do inferno que se estendeu por países onde até poucos anos crianças iam para a escola e seus pais, para o trabalho, todas as manhãs.

Morre-se, também,  no Mar Mediterrâneo, quando naufragam embarcações frágeis e superlotadas a caminho de um destino incerto em um continente, a Europa, que odeia e rejeita os refugiados de seus próprios erros, alguns tão velhos quanto a política de colonização que adotou em um continente que ocupou, roubou e violentou, de todas as maneiras, por séculos a fio.

Para não escrever a mesma coisa, desta vez sobre os mortos de Catânia, reproduzo texto do final de 2013, sobre os mortos de Lampedusa, que pereceram em um dos mesmos inumeráveis naufrágios, nas mesmas circustâncias, nas mesmas geladas profundezas, em que recebem, agora, os corpos daqueles que, empurrados pelo desespero, a fome  e a violência, os seguiram para a morte, fazendo uma trágica travessia que, na maioria das vezes, não leva a lugar nenhum:    

"Berço de antigas civilizações, o Mar Mediterrâneo abriu suas águas, por dezenas de séculos, para receber, em ventre frio e escuro, os corpos de milhares de seres humanos.

Mar de vida, morte e sonho, Ulisses, na voz de Homero, singrou suas águas. E tampando os ouvidos, para não escutar o canto das sereias, aportou em imaginárias ilhas, fugindo de Cíclope e Calipso, para enfrentar, a remo e vela, os ventos de Poseidon em fúria.

Por Troia, Cartago, nas Guerras Púnicas ou do Peloponeso, mil frotas cavalgaram suas ondas, pejadas de armas e guerreiros. E, no seu leito descansam, se não os tiver roído o tempo, comerciantes fenícios e venezianos, guerreiros atenienses e espartanos, os pálios e as espadas de legionários romanos, escudos e capacetes cartagineses, navegantes persas, cavaleiros cruzados, califas e sultões.
Os mortos do Mediterrâneo descansam sobre seu destino.

Suas mortes podem não ter sido justas, mas, obedeciam ao fado das guerras e do comércio, à trajetória do dardo ou da flecha que subitamente atinge o combatente, ao torpedo disparado pelo submarino, à asa, perfurada por tiros de artilharia, de um bombardeio que mergulha no mar a caminho da África do Norte, ao sabre que os olhos vêem na mão do inimigo e à dor do imediato corte.

De certa forma, elas obedeciam a uma lógica.

Mas não há lógica ou utilidade nas mortes que estão ocorrendo nestes dias, dos meninos e meninas que se afogam, em frente à costa italiana, na tentativa de chegar a solo europeu, depois de atravessar o Mediterrâneo.

Há anos, centenas de pessoas têm morrido dessa forma. No dia 3 de outubro, um naufrágio na ilha italiana de Lampedusa deixou ao menos 339 mortos – quando cerca de 500 imigrantes vindos da Eritreia e da Somália tentavam chegar à Itália. Oito dias depois, uma embarcação com 250 imigrantes africanos virou na mesma região e 50 pessoas morreram.


Que crime cometeram esses meninos e meninas? Nos seus barcos eles não levavam o ouro da Fenicia, nem lanças e escudos, nem mesmo comida, nem seda ou veludo, a não ser a sua roupa, seus pais e suas mães, sua pobre e corajosa esperança de quem foge da guerra e da miséria.

Mas, mesmo assim, a Europa os teme. A Europa teme a cor de sua pele, o idioma em que exprimem suas idéias e suas emoções, os deuses para quem oram, seus hábitos e sua cultura, sua indigência, sua humanidade, sua fome.

Se, antes, lutavam entre si, os europeus hoje, estão unidos e coesos, no combate a um inimigo comum: o imigrante.

O imigrante de qualquer lugar do mundo, mas, principalmente, o imigrante da África Negra e do Oriente Médio.

Barcos de países mediterrâneos, como os da Grécia, Espanha e Itália, patrulham as costas do sul do continente. Quando apanhados em alto mar, em embarcações frágeis e improvisadas, por sua conta e risco, mais náufragos que navegantes, os imigrantes são devolvidos aos países de origem.

Antes, a imigração era, principalmente, econômica. 

Agora, a ela se somam as guerras e os deslocamentos forçados. São milhões de pessoas, tentando fugir de um continente devastado por conflitos hipocritamente iniciados por iniciativa e incentivo da própria Europa e dos Estados Unidos.

O Brasil está fazendo sua parte, abrindo nosso território para a chegada de centenas de refugiados sírios, como já o fizemos com milhares de haitianos e clandestinos  escapados da África Negra que chegam a nossos portos de navio.

A Itália lançou uma operação militar “humanitária”, para acelerar o recolhimento de imigrantes que estiverem navegando em situação de risco junto às suas costas, mas irá manter sua rigorosíssima lei de veto à imigração, feita para proibir e limitar a chegada de estrangeiros.

Como a mulher, amarga e estéril, que odeia  crianças, a Europa envelhece fechada em seus males e crises, consumida pela decadência e a maldição de ter cada vez menos filhos. 

Mas prefere que o futuro morra, junto com uma criança árabe, no meio do mar, a aceitar a seiva que poderia renovar seu destino.

Sepultados pela água e o sal do Mediterrâneo, recolhidos, assepticamente, nas praias italianas, ou enterrados, junto com seus pais, em cemitérios improvisados da Sicília – ao imigrante, vivo ou morto, só se toca com luvas de borracha - a meio caminho entre a miséria e o terror e um impossível futuro a eles arrebatado pela morte - os fantasmas dos meninos e meninas de Lampedusa poderiam assombrar, com sua lembrança, a consciência européia.

Se a Europa tivesse consciência." 

OBAMA E CUBA






(Hoje em Dia) - Em encontro histórico  no Panamá,  o Presidente dos EUA, Barack Obama e o de Cuba, Raul Castro, colocaram  fim a um confronto de décadas, concluindo movimento de reaproximação que começou com aperto de mãos entre os dois dirigentes, a poucos metros da Presidente Dilma Roussef, na tribuna de honra do funeral de Nelson Mandela, no dia 10 de dezembro de 2013.

Antes mesmo do início das negociações diplomáticas com os EUA, Cuba já estava plenamente integrada ao resto do mundo e à América Latina.

Os investimentos estrangeiros na ilha somam bilhões de dólares. Há poucas semanas, foi realizada a trigésima-segunda edição da feira Internacional de Havana, com a presença de 2.000 empresas de 60 países, entre eles a Alemanha, que esteve representada por 37 empresas, entre elas a Bosh, a MAN e a ThyssenKrupp.

A iniciativa de Barack Obama de se reaproximar com Cuba foi corajosa, mas necessária. Ao insistir em manter o bloqueio econômico sobre a ilha, os EUA estavam cada vez mais isolados, nessa questão, com relação ao resto do mundo. 

Em outubro do ano passado, a Organização das Nações Unidas condenou , pela vigésima-terceira vez desde 1992, o embargo norte-americano contra Cuba.  Cento e oitenta e oito países votaram contra os Estados Unidos, e a favor de Cuba. Três ( as Ilhas Marshall, a Micronésia, e Palau), se abstiveram. E os únicos votos a favor de Washington foram o de Israel e o dos próprios EUA.

Em 2014, 3 milhões de turistas visitaram Cuba, que está mais para um paraíso tropical, do que para o sombrio campo de concentração pintado por publicações como o "Reader´s Digest" durante a Guerra Fria - cujo fim foi anunciado agora por Obama.

O mais famigerado campo de prisioneiros em Cuba não é cubano, mas norte-americano, Obama já se comprometeu a fechá-lo, e funciona em  uma base militar dos EUA no enclave de Guantánamo.

Há quase dois anos, qualquer cubano está liberado para montar o seu próprio negócio, tirar passaporte  e viajar para o exterior, desde que tenha visto para o país de destino, incluídos dissidentes como a blogueira Yoani Sanchez, que já esteve no Brasil, e que vive em confortabilíssimo - para os padrões cubanos - apartamento em Havana, sem ser incomodada,  presa ou torturada, como ocorreria caso tivesse vivido, em passado historicamente recente, em muitos países latino-americanos.

Enquanto isso, na contramão da história, assiste-se, no Brasil, ao ressurgimento de um anticomunismo tosco, anacrônico, rancoroso e desequilibrado. Malucos vêem perigosos agentes comunistas por trás dos médicos cubanos que estão aqui trabalhando - em tudo iguais aos médicos cubanos que trabalham em cooperação com os Estados Unidos no combate ao Ebola na África - ao mesmo tempo em que usam e exibem aparelhos eletrônicos montados por empresas estatais chinesas, com participação acionária do Partido Comunista, na República Popular da China.

14 de abr. de 2015

A OAB E A DEMOCRACIA









(Jornal do Brasil) - O presidente nacional da OAB, Marcus Vinicius Furtado Coêlho, esteve na sexta-feira passada em Minas Gerais, onde se dirigiu a cerca de 3.000 advogados mineiros, na cidade de Montes Claros.
Na abertura da XV Conferência Estadual dos Advogados de Minas Gerais, ele lembrou que “para os males da democracia, mais democracia”, que a “corrupção é a negação da República”, e que “o propósito de investigar profundamente não pode implicar a violação dos princípios básicos do Estado de Direito. Os postulados do devido processo legal, do direito de defesa e da presunção de inocência são valores que devem nortear a convivência civilizada em uma sociedade democrática, com a proteção do ser humano contra o uso arbitrário do poder”, insistindo também que é preciso uma reforma política que proíba a doação de empresas privadas a campanhas e partidos políticos - no sentido da proposta que se encontra sob pedido de vistas as mãos do Ministro do STF, Gilmar Mendes - e no Plano Nacional Anticorrupção elaborado pela OAB, que tem 13 pontos principais e propõe a regulamentação da Lei 12.846 que pune as empresas corruptoras, prevê a criminalização do Caixa 2 de campanha eleitoral, a aplicação da Lei da Ficha Limpa para todos os cargos públicos, além do cumprimento fiel da Lei de Transparência e da Lei de Acesso à Informação.
No dia anterior à reunião de Montes Claros, a seção paulista da OAB já havia divulgado nota em repúdio à proposta da aceitação de provas ilícitas em julgamentos, feita pelo Ministério Público Federal, e contra o início de cumprimento de pena imposta em primeiro grau de que caiba ou penda recurso, sugerida pelo Juiz Sérgio Moro, assinada pelo seu Presidente, o doutor Marcos da Costa, com o seguinte teor:
“A Ordem dos Advogados do Brasil, Seção de São Paulo, cumprindo suas finalidades legais e estatutárias de defender a Constituição da República, a ordem jurídica do Estado democrático de direito, os direitos fundamentais da pessoa humana, o aperfeiçoamento e a rápida administração da justiça, vê-se no indeclinável dever de se manifestar sobre a atual conjuntura vivida no país e sobre as inaceitáveis investidas de setores dos operadores do Direito contra inalienáveis valores positivados no corpo permanente da Charta Magna e no ordenamento jurídico ordinário.
A democrática ordem constitucional instaurada em 1988 com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil, assegurou valores que têm a vocação da permanência, posto que, essenciais e indisponíveis, constituem o fundamento nuclear das liberdades de todos os cidadãos. 
Não são esses princípios transacionáveis ou permutáveis por soluções mágicas de supostas necessidades de ocasião, máxime quando manipuladas pelo influxo da volúvel opinião leiga.
Nessa ordem de ideias, não podem e não devem os advogados paulistas, de antigas e heróicas lutas em favor dos direitos da pessoa humana, deixar de manifestar o seu repúdio às propostas de eliminação de garantias básicas de quem se acha acusado em juízo. Por isso, aponta como manifestamente inconstitucionais as propostas de utilização de provas ilícitas no processo penal, sugestão esta feita por membros da magistratura e do ministério público, quando o artigo 5º, inciso LVI, da Carta Política garante que “são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”. Não pode haver em nosso Estado democrático de direito quem quer que seja, cujo voluntarismo e idiossincrasia possam se sobrepor ao comando constitucional.
Inassimiláveis, de outro turno, sugestões de alteração legislativa ordinária para o efeito de se desnutrir ou anular o mandamento constitucional de que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”, como preceitua o inciso LVII do referido artigo 5º da Lei Maior, pela equivocada concepção de que se deva fazer iniciar o cumprimento de pena imposta em sentença de primeiro grau de que caiba ou penda recurso.
Causa espécie, por igual, a draconiana proposição de poder o juiz decretar prisão preventiva do acusado somente com a finalidade de “assegurar a devolução do dinheiro desviado”, eis que o encarceramento antes de condenação definitiva é uma excepcional violência do Estado que somente se admite em circunstâncias de absoluta necessidade e para resguardar a ordem pública ou a marcha regular da atividade processual. Sobre não se assentar em fundamentos técnicos, a prisão por motivo econômico parece não estar adequada a um sistema digno de ser conceituado como democrático.
Tais propostas, entre outras igualmente inacolhíveis, representam um regresso civilizatório que se não compatibiliza com o regime de liberdades que conquistamos, a duras penas, após uma longa noite de autoritarismo e violência contra os direitos fundamentais.
Os que não participaram dessa resistência contra o regime de força de que nos despedimos definitivamente em 1988, não se sensibilizam com o alto preço que a Nação teve de pagar para a restauração da civilização no corpo normativo brasileiro.
Como em tempos idos, também agora e sempre, os advogados paulistas dizem não a esses ensaios de tirania e arbítrio.”
No Rio de Janeiro, os advogados também não estão indiferentes ao que está ocorrendo, como mostra artigo publicado pelo ex-presidente da OAB, no estado, Wadih Damous, publicado na edição deste mês do Jornal dos Economistas, com o título de “O Estado de Direito ameaçado”,em que afirma que “em nome do combate à corrupção cometem-se atentados de toda sorte à ordem jurídica. O desenvolvimento da chamada Operação Lava Jato mostra como, de forma paulatina, o estado de exceção vai contaminando as práticas judiciais, os atos do Ministério Público e o comportamento da polícia.
Mas as consciências também vão sendo contaminadas. Boa parte da população está convencida de que contra a corrupção vale tudo. Direitos constitucionais duramente conquistados pela democracia são tidos como obstáculos à “santa cruzada”. Amplo direito de defesa, presunção de inocência e outras garantias individuais, na prática, estão revogados. A grande imprensa cumpre um papel lamentável nesse cenário. A mídia transformou-se em partido político. E de oposição. Fomenta ódio, fabrica “inimigos do povo” e articula e incentiva abertamente manifestações de natureza golpista. Aliás, o comportamento da imprensa nos dias que correm é bem parecido com o método que adotou nas vésperas do golpe de 1964. O processo judicial se transforma em espetáculo. O juiz do processo vira herói nacional sob a luz dos holofotes e afagos da mídia. As “confissões” obtidas se transformam automaticamente em verdade e ganham as manchetes dos jornais. Permitem-se vazamentos criminosos e seletivos que mancharão por toda a vida a honra dos atingidos, ainda que considerados, ao final, inocentes. Além dessas máculas, alguns colegas advogados apontam outras diversas irregularidades práticas na condução da ação penal:
1) prisões desnecessárias, sem que existisse risco à efetividade do processo, ou seja, o sucesso das investigações não requer a efetivação de prisões;
2) as prisões são utilizadas como instrumento de coação para obter confissões e delações;
3) violação de regras de competência: nem todos os fatos investigados são da competência do juiz Sergio Moro;
4) desconsideração de formalidades processuais que são garantia contra a opressão do Estado;
5) medidas de força ilegais e desnecessárias, como a requisição do tesoureiro do PT, já que ele não havia se recusado a comparecer para prestar depoimento;
6) desconsideração das consequências sociais e econômicas das decisões, pois os danos econômicos à Petrobras produzidos com a condução do procedimento e divulgação seletiva das investigações já são maiores do que os das condutas criminosas que se pretende punir;
7) provas produzidas sem respeito ao devido processo legal.
E diga-se mais.
A delação premiada é abertamente inconstitucional porque fere, entre outros, os princípios da moralidade pública, da isonomia e do contraditório, já que os delatados e a sua defesa não têm acesso ao ato de delação nem a chance de confrontar o delator.
Legitima-se a hipótese da pena sem obediência a limites éticos e jurídicos, como nos “velhos tempos.”
No Ceará e em outros estados, advogados e a própria OAB também tem se manifestado. A Ordem dos Advogados do Brasil sempre esteve, de forma ativa, altiva e independente, presente em algumas das mais memoráveis lutas da vida nacional, como foi o caso da Campanha pela Anistia e das Diretas Já, em defesa do voto direto para a eleição do Presidente da República. Os advogados são os guardiões da Liberdade. A eles a História convoca sempre que a Pátria se vê ameaçada em sua essência, justiça, isonomia e permanência. Cabe a eles - que contam com amigos e clientes em todos os setores, classes e segmentos sociais - se estiverem dispostos a se mobilizar, uma vez mais, em defesa do Brasil, cumprir, por meio da OAB, um papel de fundamental importância na coordenação de uma aliança com outras instituições da sociedade civil, para o esclarecimento didático da população a respeito das condições em que se pode dar um processo de impeachment do Presidente da República, quanto à impossibilidade legal de qualquer tipo de “intervenção militar”; e na defesa da Democracia, e, sobretudo, da letra da Lei, do ponto de vista da contenção dos casuísmos e abusos que estão colocando em risco, neste momento, a prevalência do Estado de Direito, na preservação e garantia dos direitos individuais, em casos como o da presunção de inocência, da prisão legal, do respeito à figura do flagrante delito, da pressão sobre réus e investigados, do uso abusivo e disseminado do instituto altamente subjetivo da delação premiada, do que é e do que não é prova lícita, dos prazos e condições da privação de liberdade, e do Habeas Corpus. Não há escândalo ou crise - que, nos dois casos, tem tido sua dimensão várias vezes majorada - que possam justificar que se pise no texto da Lei e que se rasgue a Constituição, ou que se transforme o Brasil em um estado judicial, midiático e policialesco. A Pátria se assenta sobre instituições e preceitos permanentes, de Liberdade, respeito à vontade da maioria e à soberania popular expressa por meio do voto, que estão acima de quaisquer circunstâncias de tempo ou espaço geográfico, ou do momentâneo interesse ou desejo de grupos, corporações e indivíduos, por maior que seja a sua sede de poder e de notoriedade.

13 de abr. de 2015

A PETROBRAS E O FATOR POLÍTICO






(Jornal dos Economistas-RJ) - A questão da Petrobras mantém, neste momento, a situação do país em suspenso. Trata-se não apenas de um problema jurídico, mas do futuro da nossa maior empresa nacional e de dezenas de setores da economia brasileira, que vão da indústria naval à química, com implicações de toda ordem e a ameaça de eliminação de milhares de empresas e empregos.
Mas os problemas vão além dos casos de corrupção na empresa? Como poderia estar sua situação se não fosse isso?
Do nosso ponto de vista, a queda do petróleo não atrapalha a exploração do pré-sal para a Petrobras, porque o grande mercado da Petrobras é o brasileiro. O que baliza o preço que a Petrobras obtém pelo óleo extraído no pré-sal ou pelo óleo que ela troca pelo petróleo do pré-sal lá fora é o custo final do combustível no mercado nacional.
É a Petrobras que forma o preço do petróleo no mercado brasileiro, e essa condição de formação de preço só se veria ameaçada se houvesse importação de combustível em enorme escala por empresas concorrentes, para substituir a produção nacional da empresa.
Essa é uma possibilidade distante, que não poderia se dar sem um tremendo esforço logístico, que implicaria, por sua vez, no aumento do custo, diminuindo a margem de lucro de suas concorrentes, o que neste momento não interessaria a ninguém.
O grande problema é o câmbio, considerando-se que muitos dos insumos e serviços da Petrobras são importados. Mas ainda assim, a manutenção desse quadro, em que o grande foco é o mercado interno, com o aumento paulatino da produção nacional de petróleo e a de refi no, só tende a ajudar a Petrobras, com a recuperação de suas margens de lucro no futuro.
Com relação ao mercado internacional, em médio prazo, a recomposição do preço do petróleo tende a ocorrer por várias razões. Primeiro, a concorrência do petróleo saudita mais barato com o óleo e o gás de xisto dos EUA, que pode diminuir a oferta de produção local no maior mercado do mundo.
Em segundo lugar, pela pressão de outros membros da OPEP para que haja corte na produção. Em terceiro lugar, pela diminuição dos estoques norte-americanos e chineses, que deve ocorrer devido ao aquecimento da economia dos EUA e das exportações chinesas, como já se viu no início deste ano. Depois, vem a possibilidade de recuperação da economia europeia, caso seja bem sucedido o pacote de estímulo do BCE, e, por último, a de haver um aumento da tensão na Ucrânia, que pode vir a prejudicar o fornecimento russo de gás para a União Europeia. Em uma situação normal, em que fosse considerada apenas a lógica produtiva e de mercado, a Petrobras estaria vivendo um excelente momento.
A expectativa negativa criada em torno da empresa, no entanto, gerou uma posição institucional que não condiz com as perdas efetivamente detectadas até agora com os casos de corrupção descobertos – que têm sido várias vezes multiplicadas pela mídia e por todo o tipo de “fontes” e “analistas” – e que a está empurrando para a realização de desinvestimentos. Isso é muito mais grave do que as suas perspectivas reais de produção e de mercado, mesmo quando levada em consideração a situação vivida neste momento pela indústria de óleo e gás em todo o mundo.
Essa é uma situação que só poderia ser minorada, por exemplo, se a empresa tomasse uma decisão que revertesse as expectativas e contornasse os problemas que tem tido nas bolsas ocidentais e com a má vontade de agências de qualificação como a Moody´s.
Esse seria o caso, por exemplo, do estabelecimento de uma aliança que lhe garantisse a obtenção de recursos e de apoio alternativos – para a execução dos projetos que estão em andamento – com parceiros alternativos que fossem financeira e tecnicamente poderosos, como a China.
A Petrobras tem excelente tecnologia (acaba de ganhar, pela terceira vez, o maior prêmio do mundo, outorgado pela OTC, no Texas, nos EUA, nessa área), produção e gigantescas reservas de petróleo e gás, em ascensão neste momento, e uma situaçãopredominante em um dos maiores mercados do mundo.
A única coisa que pode atrapalhá-la é o fator político.

12 de abr. de 2015

OS PAIS E OS FILHOS






(Hoje em Dia) - Para um pai, não existe momento mais importante, mágico e profundo, que o nascimento de um filho, e é natural que assim seja, já que o filho é, para o pai, a única forma de permanência no mundo, e a esperança tênue de que a memória de sua existência seja transportada, por seus filhos e os descendentes deles, para o futuro. É, assim, compreensível, que choque à maioria das pessoas, e pareça uma brutal agressão à ordem natural das coisas, que filhos morram antes de seus pais, principalmente quando essa morte ocorre de forma abrupta e inesperada, em um átimo de segundo. Na semana passada, dois meninos - para seus pais eles serão sempre meninos - morreram no Brasil, entre muitos outros. Um chamava-se Thomaz, era piloto de helicóptero e filho do Governador de São Paulo, e tinha 31 anos. O outro, Eduardo de Jesus, sonhava em ser bombeiro e tinha dez anos. Era filho de um casal de migrantes nordestinos que viviam no Morro do Alemão, no Rio de Janeiro. Thomaz caiu quando acompanhava um vôo de teste de manutenção, com mais quatro pessoas. Eduardo morreu com um tiro, em frente de sua casa, em uma suposta situação de confronto - desmentida pelas testemunhas presentes - entre policiais e traficantes. A dor do Governador de São Paulo e de José Maria de Souza Ferreira, o pai do menino Eduardo, e de suas esposas, é incomensurável. E a súbita igualdade de seu sofrimento deveria servir de reflexão para aqueles que acham que só eles trabalham e pagam imposto, que desqualificam os nordestinos, e acreditam que nas comunidades da periferia só moram marginais, que toda criança que leva uma bala “perdida” ou com “endereço certo”, é “menor do tráfico” ou que quem reside em favela está arriscado a morrer, de uma hora para outra, porque “tolera a presença da marginalidade”, ou não se “esforçou” o suficiente para morar em outro lugar. Piloto de helicóptero, Thomaz Alckmin sabia que trabalhava em uma profissão perigosa, e infelizmente, houve problemas com a máquina em que estava, mesmo depois do trabalho de manutenção executado pelos mecânicos e peloo piloto que estavam no vôo, que com certeza também eram pais como ele, e filhos de outros pais que também estão sofrendo agora. Eduardo de Jesus Ferreira teve a má sorte de nascer em um país no qual tabaco e álcool podem ser consumidos à vontade, e se continua acreditando que a proibição e a repressão vão impedir alguém de se drogar ou de comercializar outras substâncias tóxicas consideradas “ilícitas”. Um país no qual o número de prisões e de mortes como a sua continua aumentando, junto com o consumo de crack, maconha, cocaína e anfetamina, enquanto a ONU contesta esse tipo de combate. No dia em que Eduardo morreu, faleceram mais pessoas assassinadas no Brasil, quarto maior país do mundo em número relativos e primeiro em absolutos, do que em todo o ano de 2014 no Uruguai, nação em que o governo assumiu a produção e a comercialização da maconha. Aqui, são 65.000 mortes por ano, quase 35 por 100.000 habitantes, por lá, foram menos de 300 pessoas no ano passado, cerca de 7 por 100.000 uruguaios.

A PETROBRAS QUE O INGLÊS NÃO VÊ




(Hoje em Dia) - Seguindo o tom alarmista e catastrofista que tem adotado nos últimos tempos com relação ao Brasil, o periódico britânico Financial Times publicou artigo na semana passada, colocando em dúvida a previsão de que o país possa se tornar um dos maiores produtores mundiais de petróleo nos próximos anos. No texto, o FT alerta para “possíveis problemas financeiros” decorrentes das denúncias de corrupção na empresa; cita a queda do preço do petróleo no mercado internacional como outro fator negativo; e, após ouvir “analistas”, conclui que “a exploração do pré-sal” não é mais viável, no Brasil, para a Petrobras. Ao fazer isso, o Financial Times parece ignorar, olimpicamente, fatos concretos, alguns deles, recentes. O primeiro, é que a exploração de petróleo do pré-sal não é uma hipótese - ela atingiu 824,2 mil barris diários no dia 3 de março, em petróleo equivalente (670 mil barris de petróleo e o restante em gás), com 43 poços produtores.
O segundo, é que a produção total de petróleo continua crescendo no Brasil. 
Em janeiro, a produção nacional aumentou mais de 22% com relação ao mesmo período do ano passado, com 92,2% sendo gerada pela Petrobras, que em novembro, já havia ultrapassado a EXXON norte-americana como a maior produtora de petróleo do planeta entre as companhias de capital aberto.
Quanto à baixa cotação do petróleo no mercado internacional, a Petrobras é uma empresa que será cada vez menos, no futuro, uma produtora de petróleo bruto destinado ao mercado externo, e, cada vez mais, um grupo de energia que - do poço à bomba - produz combustíveis e lubrificantes acabados destinados principalmente ao mercado interno.
Mesmo que não fosse assim, a cotação do petróleo tende a se recuperar a médio prazo, com o fechamento de empresas norte-americanas produtoras de gás de xisto. Há, ainda, a pressão de membros da OPEP por cortes na produção da Arábia Saudita. E haverá aumento do consumo nos dois maiores mercados do mundo, com a recuperação da economia norte-americana e das exportações chinesas, como se viu no início do ano.
O FT não diz, mas o grande capital da Petrobras é a tecnologia que só ela detêm, e que está fazendo com que receba, pela terceira vez, no mês que vem, o “oscar” da indústria petrolífera mundial, o OTC Distinguished Achievement Award for Companies, Organizations, and Institutions, em reconhecimento ao know-how desenvolvido para a produção no pré-sal.

Também na semana passada, por exemplo, foi iniciada a produção do campo marinho de Hadrian South, localizado a cerca de 370 quilômetros da costa da Louisiana, o quinto em produção pela Petrobras em águas ultra-profundas dos Estados Unidos, na região do Golfo do México - porque não existem empresas 100% norteamericanas para fazê-lo - mas isso, é claro, o Financial Times não deu.

9 de abr. de 2015

OS EMPRESÁRIOS E A DEMOCRACIA





(Jornal do Brasil) - Não existe liberdade econômica sem liberdade política, e o melhor regime para se empreender é a democracia. Isso demonstram os números da economia brasileira, na maior parte dos anos deste início de século, e fatos como o divulgado no início desta semana de que o Brasil acaba de conquistar, segundo o GEM - Global Entrepreneurship Monitor, o título de nação mais empreendedora do mundo. Ora, tanto a economia quanto a política, pressupõem o respeito a regras previamente estabelecidas, e a necessidade de que as disputas transcorram com um mínimo de estabilidade. O caos não interessa a quem emprega, a quem produz, a quem empreende, assim como não interessam o terrorismo, nem o boato, nem a distorção de fatos e de dados, nem interessa o pessimismo, que, como qualquer pessoa de bom senso pode perceber, são ótimos para os que desejam hipócrita e interessadamente a crise, e nefastos para quem precisa trabalhar e depende diretamente do clima e do humor do ambiente de negócios. Até agora, as principais entidades ligadas ao empresariado, como a CNI - Confederação Nacional da Indústria, a CNA - Confederação Nacional da Agricultura, e a CNC - Confederação Nacional do Comércio - a exemplo de outras organizações da sociedade civil, como a OAB - têm mantido prudente distância dos protestos que defendem o impeachment da Presidente da República e a delirante tese de uma “intervenção militar”. É preciso, portanto, prestar atenção, quando - em momento em que alguns de nossos maiores empresários estão sendo tratados como bandidos em meio a um inquérito que ainda está em curso, e suas empresas estão ameaçadas de quebra e de arrastar com elas dezenas, centenas de médias, pequenas e micro empresas, jogando milhares de brasileiros no olho a rua - formadores de opinião que circulam no meio empresarial começam a defender a quebra da normalidade política, e a lançar assustadores alertas ao público, na esteira de movimentos que não têm a menor possibilidade de sucesso, do ponto de vista da Legislação. Este é o escopo de artigo publicado na coluna de opinião de conhecido jornal paulista na semana passada, que compara o momento atual com a campanha das Diretas e a do impeachment de Collor. O autor, que trabalha com a organização de feiras e encontros empresariais, reconhece que não há “arcabouço técnico-jurídico” para um pedido de impeachment da Presidente da República. Mas diz que essa é uma discussão “para o Direito”. Que o dia 15 de março abriu novo marco na vida institucional. Saúda o surgimento de um tipo de cidadão com “apurada conscientização política”. Afirma que a vida política e institucional passou a ser banhada por “gigantesco lamaçal”. E conclui que a sociedade clama por uma “cirurgia rápida”, “antes que seja tarde”. Ora, é extremamente temerário relegar a lei, e o direito, a uma simples “discussão” para especialistas. Principalmente, quando se vive um momento em que milhares de cidadãos, justamente porque seu nível de informação e de “apurada conscientização política” é discutível, insistem cada vez mais em exigir medidas que são tão improváveis, como impossíveis e absurdas, no marco da plena vigência do Estado de Direito. Como é temerário dizer que a política econômica do país se exauriu, quando continuamos com uma das mais baixas taxas de desemprego da história, com as reservas monetárias em um dos mais altos níveis - acima de 360 bilhões de dólares - a dívida interna líquida é a metade do que era há 12 anos, o PIB cresceu mais de quatro vezes, em dólar, desde 2002, e as principais agências de qualificação internacionais mantêm a nota do Brasil em Grau de Investimento, diante da solidez dos fundamentos nacionais na macro-economia. Assim como é temerário, ou no mínimo extremamente seletivo, dizer que o país passou a ser tomado por um gigantesco lamaçal, como se nunca antes se houvesse praticado corrupção nesta República. Por acaso o Banestado, o Mensalão do PSDB, o Trensalão Paulista, a privatização do BANESPA e da Vale do Rio Doce, o caso das Termelétricas Merchant - muitos deles jamais investigados, ou, hoje, prescritos - estão, por obra e graça de alguns, ou de secretas indulgências papais, imaculadamente limpos e não fazem, moralmente, ou melhor, imoralmente, parte desse mesmo pântano e dessa mesma lama? Por acaso não é preciso investigar, com o mesmo rigor, casos como os do CARF, da Máfia das Próteses, do HSBC - que, como podemos ver, nos lembra a proclamação de que aquele que nunca pecou, deveria atirar a primeira pedra - ou vamos punir apenas o que ocorreu no âmbito da Petrobras? É cedo para fechar ciclos, até porque, se assim fosse, a atual Presidente da República não teria sido eleita, pela maioria dos brasileiros, ainda há menos de seis meses. Se pode argumentar que recentes pesquisas têm atribuído a Dilma Roussef popularidade extremamente baixa, da mesma forma que se pode contra-argumentar que, à mesma época de seu segundo mandato, a popularidade de Fernando Henrique Cardoso também estava em situação parecida, e que nem por isso ele foi extirpado, do poder, a qualquer preço. Assim como também é certo que petistas e outros opositores, naquele momento, pediram a saída do então Presidente da República, o que não foi alcançado, para o bem da democracia. Afinal, por mais que se esteja contra um governo, uma nação tem que ter regras e ritos - calendário eleitoral, sistema político estável e definido, leis que devem ser obedecidas. Nem um erro pode justificar o outro nem um país pode trocar de presidente, como um garçom - ou um “palestrante” acostumado com palcos e encontros “empresariais” - troca de camisa. Se tivesse conseguido forçar um impeachment de Fernando Henrique - que passou a lei de reeleição no Congresso com manobras de “toma-lá-dá-cá” questionáveis, e praticou, no mínimo, um estelionato eleitoral cambial, deixando para desvalorizar o dólar logo após sua posse no segundo mandato como Presidente da Republica - o PT teria cometido, então, uma agressão à democracia, como estão fazendo, agora, aqueles que pretendem que Dilma saia do Palácio do Planalto “por qualquer meio”, e o “mais depressa possível”, como defendem, muitos, repetidamente, nos principais "portais" da internet. Finalmente, o apelo a uma solução “rápida e cirúrgica”, feita pelo autor, é a afirmação mais grave e perigosa. Ao empresariado brasileiro - aquele que produz e não o que vive de firulas - não interessa a quebra da ordem política ou institucional. Qualquer fator que possa favorecer a crise - e a atual tem sido em boa parte propositadamente forjada e constantemente realimentada junto à opinião pública pela turma do “quanto pior melhor” - pode atrapalhar, como já está atrapalhando, os seus negócios. Nesse caso, o melhor caminho não é o de se fazer “cirurgias” e “intervenções” de que não se pode adivinhar, com certeza, o que virá depois, mas, sim, voltar ao normal, antes que seja tarde. Afinal, o empresário que torce pela quebra da normalidade, está torcendo, em primeiro lugar, contra si mesmo. Ele deve, neste momento, se fazer as seguintes perguntas: Alguma coisa o está impedindo, a priori, de fazer negócios? De trabalhar ? De continuar operando com a sua empresa? A vida, à sua volta, está “normal” ou “anormal” ? Os problemas que está vivendo são de ordem estrutural, ou conjuntural, como sempre ocorreu nas “crises” que enfrentou antes? É melhor seguir adiante, ou apostar no imprevisível, no aleatório, no imponderável? Infelizmente, quando se quebra o ritmo natural das coisas, os tiros costumam sair pela culatra. Nos anos 1920 e 1930, na Alemanha, as ruas também se encheram de gente que não estava propensa a esperar as próximas eleições, pedindo que se mudasse tudo, que se enquadrasse o Parlamento, que se estabelecesse a “ordem” e o crescimento, que se punissem os corruptos, que se acabasse com certa parte do espectro político, que se reformasse o país para que do passado não sobrasse “pedra sobre pedra”. Quando as eleições vieram, elas votaram em Adolf Hitler, que pressionou de todas as formas até ser nomeado Chanceler do Reich, por Hindemburg. A “cirurgia” que se seguiu, que era para ser “rápida”, e "segura", deixou, nos 5 anos que se seguiram, uma nação devastada e mais de 60 milhões de mortos em todo o mundo. Depois da ascensão do ridículo führer anti-semita e anticomunista ao poder, muitos empresários que o haviam apoiado e financiado, perderam, na Segunda Guerra, seus filhos e netos. Outros tiveram seus negócios ocupados por gente que tinham empurrado para a rua para derrubar o governo anterior. E muitos caíram em desgraça com os novos senhores da Alemanha, tomando, cabisbaixos, o rumo de Dachau, Bergen-Belsen, e de outros campos de concentração ou de extermínio.