(Jornal do Brasil) - Um
procurador do Ministério Público, do Estado de Goiás, usando de argumentação e
justificativa claramente políticas, que refletem - sem esconder apaixonada
ojeriza - sua opinião a respeito do atual governo, manda tirar do ar a campanha
das Olimpíadas.
Outro
procurador, ligado à Operação Lava-Jato, afirma que é preciso, no contexto do
trabalho realizado no âmbito da mesma operação, “refundar a República”.
Ora,
não consta na Constituição Federal, que o Ministério Público, tenha entre suas
atribuições, refletir a opinião pessoal - e muito menos partidária, que lhes é
vetada - de seus membros, ou a de “refundar a República”.
A
República, organizada enquanto Estado, fundamenta-se na Lei, e um de seus principais
guardiões é, justamente, o Ministério Público, a quem cabe obedecer à
Constituição Federal, até que esta, eventualmente, seja mudada em Assembleia
Nacional Constituinte.
Se
alguns procuradores do Ministério Público querem “refundar” a República, que,
do modo que está, parece não ser de seu feitio, o caminho, em nosso atual
regime, é outro:
Cabe-lhes
lutar, como cidadãos, pela convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte.
E,
depois, quem sabe favorecidos pela notoriedade alcançada pela espetacularização
de certas “operações” em curso, abandonar a carreira e passar a exercer – o que
também lhes é vetado enquanto não o façam – atividade político-partidária.
Candidatando-se,
finalmente, ao posto de deputados constituintes, para mudar o texto constitucional,
e, por meio deste, a Nação.
Há
um estranho fenômeno, neste Brasil dos últimos tempos, que é o de que
funcionários da estrutura do Estado se metam a querer tutelar politicamente a
Nação, principalmente quando a atividade política lhes é – sábia e claramente –
vetada pela própria carreira.
Falta-lhes
mandato para fazê-lo, ou para “salvar o Brasil”, embora, aproveitando-se da
criminalização geral da atividade política e de campanhas destinadas a
angariar, de forma corporativa, apoio na opinião pública para suas teses - o
que inclui tentar legislar indiretamente - eles continuem insistindo nisso,
como se organizados estivessem em verdadeiros partidos.
Neste
caminho, confundem-se – em alguns casos, quem sabe, propositadamente - alhos
com bugalhos, e pretende-se transformar em crime o que não passam de atos
inerentes à própria atividade política.
Esse
é o caso, agora, por exemplo, do fato de a imprensa pretender transformar em
denúncia a afirmação do Procurador Geral da República, Rodrigo Janot, em sua
peça contra o Deputado Wander Loubet, encaminhada ao STF, de que Lula teria
dado pessoalmente “ascendência” ao Senador Fernando Collor, sobre a BR
Distribuidora, em 2009, em troca de “apoio para o governo no Congresso”.
Ora,
não é possível acreditar que o nobre Procurador tenha estranhado, ou queira
transformar em fato excepcional e muito menos em crime – caso isso tenha mesmo
ocorrido, o que já foi desmentido pelo ex-presidente - a nomeação de membros de
um ou de outro partido para a diretoria de uma empresa pública, em um regime
presidencialista de coalizão.
Crime
existirá – e deve ser exemplarmente punido - se for efetivamente,
inequivocamente, provado, o eventual desvio de dinheiro do erário pelos que
foram, então, indicados, para cargos nessa empresa.
O
resto é Política, no sentido de uma prática que vem se consolidando desde que
os homens começaram a se reunir em comunidade, e, em nosso território, desde as
Capitanias Hereditárias, quando, em troca também de apoio político a El Rey, na
Metrópole, nobres eram indicados para a exploração de nossas riquezas; passando
pelo Império, em que partidos e políticos eram apoiados ou indicados pelo
imperador de turno em troca de fidelidade; pela República Velha; por Getúlio
Vargas e o Estado Novo; por JK à época da construção de Brasília; pelo regime
militar, que nomeava até prefeitos de capitais e senadores biônicos, pelo
governo do próprio Fernando Collor; pelos de Itamar Franco e de Fernando
Henrique Cardoso, pelos governos de Lula e de Dilma Roussef, que não teriam
como governar – sem apoio do Congresso ou de determinadas parcelas do eleitorado
- se não tivessem assim agido.
Afinal,
os partidos políticos existem para disputar, conquistar e ocupar o poder no
Estado, para fazer obras ou levar, em troca de votos e de simpatia, por meio de
projetos e programas, benefícios à população, e disputam e negociam entre si
cargos e pedaços da estrutura pública para atingir tais objetivos.
Essa
é a essência da Democracia – um regime imperfeito, cheio de defeitos, mas que
ainda é o melhor que existe, entre aqueles que surgiram ao longo dos últimos
2.500 anos, e, fora isso, só existem, na maioria das vezes, ditaduras nuas, duras e cruas, em que a
negociação é substituída pela vontade, o arbítrio e o terror dos ditadores.
Vivemos
em tempos em que não basta destruir-se, institucionalmente, a Política, como se
ela fosse alguma coisa à parte do país e da sociedade, e não um instrumento – o
único que existe - para a busca do equilíbrio possível entre os vários setores
sociais, grupos de interesse e a população.
Agora
se pretende criminalizar também a prática política, como se alianças entre
diferentes partidos ou a nomeação de pessoas para o preenchimento de cargos de
confiança, ou a edição de medidas provisórias – destinadas a assegurar milhares
de empregos em um momento de grave crise econômica internacional - fossem, em
si mesmos, crimes, e não, como são em qualquer nação do mundo, atos normais e
corriqueiros de negociação política e de gestão pública.
Obviamente,
seria melhor que as agremiações políticas se reunissem apenas em torno de
ideias, propostas e bandeiras e não de cargos, verbas, empresas, mas quem ocupa
o poder tem a prerrogativa de indicar quem lhe aprouver ou contar com sua
confiança e se for para se mudar isso, qualquer mudança terá que ser feita no Poder Legislativo, por deputados e senadores, que para isso são
escolhidos, por meio do voto, por seus eleitores.
O
que está ocorrendo hoje é que, com a cumplicidade de uma parte da mídia,
voltada para a deseducação da população quanto ao Estado e à cidadania, há
funcionários públicos que, longe de se submeter ao poder político – e na
ausência de votos, que não têm - pensam que foram guiados pela mão de Deus na
hora de preencher as respostas dos exames em que foram aprovados, tendo sido
assim ungidos pelo altíssimo para assumir o destino de comandar o país e
corrigir os problemas nacionais, que não são – e nunca deixarão de ser -
poucos.
A
situação chegou a tal ponto de surrealismo que alguns espertos e os imbecis que
os secundam na internet, parecem querer dar a impressão de que a solução para o
país seria acabar com as eleições e os partidos e fazer concurso para
vereadores, prefeitos, deputados, governadores, senadores, ministros do Supremo
Tribunal Federal – essa última “sugestão” se multiplica por centenas de sites e
redes sociais - e para Presidente da República.
Substituindo,
assim – como se tal delírio fosse de alguma forma possível - a soberania
popular pela “meritocracia” e o suposto saber e competência de meia dúzia de
iluminados que entraram muitos deles, na carreira pública, por ter dinheiro
para pagar cursinhos e na base da decoreba para passar em exames - criados por
empresas e instituições terceirizadas, que ruborizariam - pelo estilo e forma
como são elaborados - um professor secundário dos anos 1950.
Afinal,
para parte da burocracia atual - à qual se poderia acrescentar, sem medo de
exagerar no erro, um “r” a mais, do ponto de vista de seu entendimento prático
e histórico do que é e de como funcionam nosso sistema político e a própria
Democracia - o povo brasileiro é visto como uma massa amorfa e ignorante, que
não sabe, nem merece, votar, e que dá o tom do nível intelectual e de
“competência” daqueles que chegam eleitos, ao Executivo e ao Legislativo.
Tudo
lindo, maravilhoso.
Se
não fossem, boa parte das vezes, péssimos os serviços prestados à população por
essa mesma burocracia; se os cidadãos não estivessem conscientes da importância
do direito de voto de quatro em quatro anos; se o artigo primeiro da
Constituição Federal não rezasse que todo o poder – mesmo o dos burocratas de
qualquer tipo - emana do Povo e em seu nome deve ser exercido; se não houvesse
carreiras que pagam quase 100 vezes mais do que ganha um trabalhador da base da
pirâmide social - recente matéria do Jornal o Estado de São Paulo, mostra que, com mordomias, férias, etc, e verbas indenizatórias de todo tipo, há aposentados do STJ recebendo mais de 100.000,00, que há subprocuradores-gerais da República, ganhando uma média de mais de 62.000,00 reais por mês, e que mais da metade dos procuradores e subprocuradores recebem acima do teto constitucional (o juiz Sérgio Moro, também); e, finalmente, se mais de 600 funcionários concursados não tivessem sido
demitidos, no ano passado, a bem do serviço público, só na esfera federal, por
crimes como prevaricação, peculato, extorsão, corrupção, etc.
Afinal,
para o bem da população - que pode votar sem exigir diplomas de seus candidatos
- passar em concurso – por mais que pensem o contrário muitos brasileiros - não
é selo nem garantia de honestidade, nem de caráter, nem de sanidade mental, nem
de compromisso com o bom senso, ou com o futuro, com a soberania, o
desenvolvimento e a dignidade da Nação.
Ou
passou a ser isso tudo, e não fomos informados disso?
Não é necessário comentar mais uma excelente análise de um brilhante articulista.
ResponderExcluirMas a propósito da mídia e do atual momento: enquanto pulula o diversionismo da mídia sobre contos da carochinha ou do Monteiro Lobato no Sítio do Picapau Amarelo, está sendo colocada uma cortina de fumaça sobre um fato gravíssimo que está pra acontecer: será votado em breve, em REGIME DE URGENCIA, o PLS 555/2015, de autoria do senador Tasso Jereissati, o qual determina privatizar todas as sociedades de economia mista e estatais federais, estaduais e municipais, transformando-as em SOCIEDADES ANONIMAS !!!!!! Ninguém está falando sobre isso !!!!! É gravíssimo, se aprovado, acabará com o Brasil. A esquerda brasileira permitirá que nos tornemos um sub-país?
No Paraná terra dos pinheirais, o Governador Richa quer privatizar a COPEL, unica empresa de energia elétrica estadual que dá lucro no Brasil, a SANEPAR responsável pelas águas do Paraná (basta ver o que acontece no Tio Sam, quanto desastrosa tem sido esta medida, o ensino, etc.
ResponderExcluirSe isto vier a ocorrer o que será das futuras gerações no Brasil...
Parabéns. Mais uma vez análise muito lúcida da nossa situação.
ResponderExcluirExcelente análise. De fato, a tecnocracia brasileira está se tornando um fator de desestabilização da democracia.
ResponderExcluir