20 de abr. de 2016

DE CHIFRES E DE CAVALOS







(JB online) - A Agência Brasileira de Inteligência comunicou em nota que o Brasil teria sido ameaçado, em novembro, pelo Estado islâmico, por meio de um twitter supostamente assinado por um francês chamado Maxime Hauschard, um “integrante do grupo”, cujo perfil teria sido posteriormente deletado.


O assunto, segundo a ABIN, veio à tona por causa de uma palestra do chefe do “Departamento de Contraterrorismo” da agência, no Rio de Janeiro, falando sobre a Olimpíada.  

Ora, não se conhecia que a ABIN dispusesse de um “Departamento de Contraterrorismo”, e seria interessante saber sob que circunstâncias ele foi criado, e com autorização de quem, já que essa atitude – que muitos veriam como normal e corriqueira - tem diretas consequências para a diplomacia e as relações externas do pais e que cabe à Presidência da República, por meio do Gabinete de Segurança Institucional e da Câmara de Relações Exteriores e Defesa Nacional, supervisionar as atividades da organização, e ao Congresso Nacional exercer o controle externo, por meio de órgão composto, entre outros membros, dos líderes da maioria e da minoria na Câmara e no Senado, assim como dos Presidentes das Comissões de Relações Exteriores e de Defesa Nacional das duas casas, como reza a legislação que lhe deu origem.

Voltando ao twitter supostamente assinado por Maxime Hauschard, será difícil saber se esse cidadão realmente existe, e, em caso afirmativo,  virtualmente impossível comprovar se ele, um “terrorista” foragido, foi realmente o autor da mensagem, ou se “Monsieur” Haushard foi “clonado” e a mensagem eventualmente “plantada” – já que o perfil, que sequer se sabe se era falso, foi, curiosamente, apagado depois – por agentes de inteligência  de outros países interessados em envolver  o Brasil com uma doutrina “antiterrorista” que não lhe diz respeito, com o objetivo de assegurar o alinhamento de nossas forças de inteligência e de segurança a organizações congêneres “ocidentais”, levando-nos a  tomar partido em uma briga que não é nossa, com uma decisão de administrativa de grande gravidade, que, para ser tomada, precisaria ser discutida no âmbito do Congresso, da diplomacia e da sociedade, de forma ampla, transparente e irrestrita.

      
Se tratava, a mensagem, de fato, de uma ameaça, ela não deveria – em benefício da estratégia e da discrição característica dos serviços de inteligência - ter sido divulgada, e, sim, combatida e investigada, em sigilo. 

Se, em caso de uma improvável comprovação inequívoca de sua autoria, tratou-se apenas de um episódio irrelevante, de um mero twitter de um “integrante” do grupo, e não de um ameaçador vídeo, com um refém decapitado, por exemplo, como costuma ser feito pelo EI, mereceria menos ainda ter sido digna de nota oficial e de divulgação à imprensa, até mesmo para evitar caracterizar uma reação despropositada e uma postura exagerada de confronto, que poderá, sim, nos criar problemas no futuro.

Os órgãos de inteligência e de segurança brasileiros, precisam parar de querer ficar emulando seus congêneres estrangeiros de potências que se metem na vida e em territórios alheios, como a Europa (via OTAN) e os Estados Unidos, a ponto de terem armado os grupos que deram origem ao próprio Estado islâmico, no início, para derrubar governos estáveis em países que tinham uma vida relativamente normal antes da Primavera Árabe, e que hoje se transformaram em um monte de ruínas.

Os inimigos dos EUA não são, por mais que cresçamos vendo filmes e séries de TV norte-americanas – e muitos quisessem abjetamente ter nascido nos EUA - necessariamente, como por osmose, nossos inimigos.

Temos, como Nação, interesses próprios, ditados por nosso lugar no mundo e nossa posição geopolítica, é com eles que devemos nos preocupar, e entre essas prioridades não está a de ficar vendo ou inventando fantasmas onde não existem, para justificar eventos, leis específicas, ou, indiretamente, a existência de agências de inteligência, que são, sim, extremamente importantes para qualquer nação, mesmo aquelas que não confundem a busca da preservação da paz e da soberania, com eventual fraqueza ou  vulnerabilidade.
 
Antes de se começar a falar em Lei Antiterrorista, não se identificavam “ameaças” contra o Brasil na internet – nem mesmo um mero e discutível twitter.

É recomendável parar de ficar discutindo exaustiva e publicamente a possibilidade de haver atentados durante as Olimpíadas no Rio de Janeiro, antes que eles venham a se confirmar, eventualmente, não por causa da suposta mensagem de novembro, mas como reação à excessiva ligação que o Brasil tem estabelecido, nos últimos tempos, com países ditos “ocidentais” nesse contexto.

O trabalho de inteligência se faz entre quatro paredes, com a preservação, sob segredo, tanto de eventuais preocupações, como das informações coletadas que estejam relacionadas a elas.

Com todo o respeito, ao dar publicidade ao “fato” a ABIN faz o mesmo que fez o governo Dilma, ao aprovar uma Lei Antiterrorista desnecessária - o código penal, sem chamar a atenção, e sem qualquer matiz ideológico, bastava para investigar e colocar atrás das grades responsáveis por homicídios ou atentados – inócua – em outros países esse tipo de lei não tem evitado a ocorrência de ataques - e inadequada do ponto de vista diplomático e estratégico: age como se estivesse procurando – correndo o risco de dar bom dia ao quadrúpede – chifre em cabeça de cavalo. 

A "MULTA-BOMBA" DE 7 BILHÕES.





(Revista do Brasil) -  Finalmente, depois de meses de pressão desumana, gestapiana, sobre o empresário Marcelo Odebrecht, o juiz Sérgio Moro levou-o a julgamento, condenando-o – baseado não em provas de sua participação direta, mas na suposição condicional de que um empresário que comanda uma holding com mais de 180 mil funcionários e que opera em mais de 20 países tem a obrigação de saber de tudo que ocorre nas dezenas de empresas que a compõem – a 19 anos e quatro meses de prisão.


Não satisfeito com a pena, e com a chantagem, que prossegue – já que o objetivo é quebrar a moral do réu – um dos poucos que não se dobraram à prepotência e ao arbítrio – com o aceno ao preso da possibilidade de “fazer delação premiada a qualquer momento”, os responsáveis pela Lava-Jato, na impossibilidade de provarem propinas e desvios, ou a existência de superfaturamento da ordem dos bilhões de reais alardeados aos quatro ventos desde o princípio da operação, pretendem impor ao grupo Odebrecht uma estratosférica multa “civil” que pode chegar a R$ 7 bilhões – mais de 12 vezes o lucro da empresa em 2014 – que, pela sua magnitude, se cobrada for, deverá levá-lo à falência, ou à paralisação destrutiva, leia-se sucateamento, de dezenas de obras e de projetos, a maior parte deles essenciais, estratégicos, para o futuro do Brasil nos próximos anos.

Com a imposição dessa multa, absolutamente desproporcional, da ordem de 30 vezes as quantias que a sentença afirma terem sido pagas em propina pela Odebrecht, por meio de subsidiárias situadas no exterior, a corruptos da Petrobras que já estão, paradoxalmente, soltos, o juiz Sérgio Moro – e seus colegas do Ministério Público de uma operação que deveria se chamar “Destrói a Jato” – prova que não lhe importam, em nefasto efeito cascata, nem as dezenas de milhares de empregos que ainda serão eliminados pelo grupo Odebrecht, no Brasil e no exterior, nem a quebra de milhares de acionistas e fornecedores do grupo, nem a paralisação das obras com que a empresa se encontra envolvida neste momento, nem o futuro, por exemplo, de projetos de extrema importância para a defesa nacional, como os submarinos convencionais e o submarino nuclear brasileiro que estão sendo fabricados pela Odebrecht em parceria com a DCNS francesa, ou o míssil ar-ar A-Darter, que está sendo construído por sua controlada Mectron, em conjunto com a Denel sul-africana, além de outros produtos como softwares seguros de comunicação estratégica, radares aéreos para os caças AMX e produtos espaciais.

Considerando-se que se trata de uma decisão meramente punitiva, ao fazer isso o juiz Moro age, no comando da Operação Lava Jato, como agiria o líder de uma tropa de sabotadores estrangeiros que colocasse, diretamente, com essa sanção – e uma tremenda carga de irresponsabilidade estratégica e social – centenas de quilos de explosivos plásticos no casco desses submarinos, ou nos laboratórios onde ficam os protótipos desse míssil, sem o qual ficarão inermes os 36 aviões caça Gripen NG-BR que estão sendo desenvolvidos pelo Brasil com a Saab sueca.

Que não tenha ele a ilusão de que essa sua sanha destrutiva esteja agradando às centenas de técnicos envolvidos com esses projetos, ou aos almirantes da Marinha e brigadeiros da Aeronáutica que, depois de esperar décadas pela aprovação desses programas, estão vendo-os sofrer a ameaça de serem destruídos técnica e financeiramente de um dia para o outro.

Como um inútil, estúpido, sacrifício, um absurdo e estéril tributo da Nação – chantageada e manipulada por uma parte antinacional da mídia, que não tem o menor compromisso com o futuro do país – a ser realizado no altar da vaidade de quem parece pretender colocar toda a República de joelhos, até que alguém assuma a responsabilidade de impor, com determinação, bom senso e respeito à Lei e à Constituição Federal, limites à sua atuação e à implacável, imparável, destruição, de alguns dos principais projetos e empresas nacionais.

Enquanto isso, para ridículo do país e divertimento de nossos concorrentes externos, nos congressos, nos governos, na área de inteligência, nas forças armadas de outros países, milhares de tupiniquins vibram, nos bares, na conversinha fiada do escritório, nos comentários que agridem e insultam a inteligência nas redes sociais, com a destruição de um dos principais grupos empresariais do Brasil, deleitando-se com a perda de negócios e empregos, e com a sabotagem e incompreensível inviabilização de algumas de nossas maiores obras de engenharia e de defesa, mergulhados em uma orgia de desinformação, hipocrisia, manipulação e mediocridade.

Mesmo que Marcelo Odebrecht venha a aceitar, eventualmente, fazer um acordo de delação premiada, nenhum jurista do mundo reconheceria, moralmente, a sua legitimidade.

Não se pode pressionar ninguém, a fazer acordos com a Justiça, para fazer afirmações que dependerão da produção de provas futuras. Assim como não se pode confundir o combate à corrupção – se houver corruptos que sejam julgados com amplo direito de defesa e encaminhados exemplarmente à cadeia, estamos cheios de gente com contas na Suíça solta e sem contas na Suíça atrás das grades – com a onipotente destruição do país e de milhares de empregos e bilhões de reais em investimentos.

A pergunta que não quer calar é a seguinte: se a situação fosse contrária, e um juiz norte-americano formado no Brasil e “treinado” por autoridades brasileiras, a quem propôs, por mais de uma vez, sua “cooperação”, estivesse processando um almirante envolvido com o programa nuclear norte-americano, e influindo no destino de todo um programa de submarinos, da construção de um novo submarino atômico, e do desenvolvimento de um míssil ar-ar para a US Air Force, a ponto de a empresa norte-americana responsável por ele ter de ser provavelmente vendida a estrangeiros, ele teria chegado, à posição em que chegou, em nosso país, o juiz Sérgio Moro?

Ou já não teria sido denunciado por pelo menos parte da imprensa dos Estados Unidos, e chamado à razão, em nome da segurança e dos interesses nacionais, por autoridades – especialmente as judiciais – dos Estados Unidos? 

O único consolo que resta, nesta nação tomada pela loucura – lembramos por meio destas palavras, que quem sabe venham a ser transportadas, em bits, para o amanhã – é que, sob o olhar do tempo, que para todos passará, inexorável, a História, magistrada definitiva e atenciosa, criteriosa e implacável, vigia, registra e julga.

E cobrará caro no futuro.

17 de abr. de 2016

UM PAÍS SOB IMPEACHMENT





Traduzida, de forma literal, a palavra inglesa impeachment significa, em português, impedimento.


Ela está relacionada à ideia de retirar-se do poder um presidente que tenha cometido grave infração, de ordem criminal ou constitucional.

No esporte, o termo impedimento – que muitas vezes pode ser imposto taticamente pela defesa contra a outra equipe - está ligado à décima-primeira Lei do Futebol, que se refere à situação em que um jogador está em posição inadequada ou interfere com uma jogada em curso.

Nos dois casos, a imposição do impedimento está dirigida a impedir que prossiga o avanço do adversário, que pode estar prestes a marcar um tento, fazendo com que ele seja obrigado a recomeçar, praticamente do zero, a busca pela consecução de seus objetivos, que são o gol e a vitória.

O problema é quando, no afã de paralisar o inimigo, corre-se o risco de “impedir” a própria partida, e, em última instância, até mesmo o público presente no estádio.

E é isso o que está ocorrendo, e continuará em jogo, no Brasil, em caso de aprovação do impeachment, hoje, ou na próxima jogada, que será decidida, em maio, na pequena área do Senado.       

O Congresso irá decidir, não apenas o impeachment de Dilma, mas se o país continuará “impedido” do ponto de vista político – e, por extensão, econômico – até, pelo menos, 2018.

Afinal, o “impedimento” do Brasil – que já se adivinhava quando tudo se fez para sabotar a realização da Copa do Mundo – começou, de fato, quando acabaram as últimas eleições.

Da sabotagem permanente, com as pautas-bombas no Congresso, às decisões e liminares judiciais, incluída a mudança das regras do jogo no meio da partida, como foi o caso das “pedaladas fiscais”, à insuportável, diuturna, pressão da mídia, alimentada por uma estratégia deliberada de lançar a população contra o governo, e a fábrica de factoides da Operação Lava-Jato, baseada, majoritariamente, em prisões ilegais, o cerceamento ao direito de defesa e delações premiadas, o país entrou em situação de impedimento prático, concreto, no dia primeiro de janeiro de 2015, para nunca mais voltar ao normal.

Um “impedimento” agravado pela decisão da Presidente Dilma, de ceder à pressão da mídia e dos adversários, e, no lugar de lançar mão de parte das reservas internacionais para liquidar a questão das “pedaladas” logo no início do governo, e criar um fundo que reestimulasse a economia, aceitar que o país estava em “crise” e em recessão, e se deixar pautar pela agenda recessiva imposta pelos “mercados”, vestindo - por ausência de uma reação articulada e à altura - a carapuça de “mentirosa” e “incompetente”, sem reagir, na política econômica e na comunicação.

Um “impedimento” agravado, também, do ponto de vista psicológico, pela busca do “quanto pior melhor”, e pela campanha permanente de crise, destinada a provocar confusão e desalento nas pessoas, embora os bares, pelo menos em Brasília, continuem tão lotados como os aviões, as rodoviárias, as estradas e os aeroportos nas férias e nos feriados.

Com isso, consolidaram-se, em um ano precioso, os paradigmas dos adversários do governo, que acabaram conduzindo, pela incompetência, isso sim, estratégica do Palácio do Planalto, o país à situação em que se encontra.   

Neste momento, a parte mais conservadora e parcial da mídia, e as “organizações”      que estão por trás dos movimentos antipetistas, assim como os inimigos do governo no Congresso, conseguiram convencer o senso comum de que basta tirar Dilma do poder, para que o país volte aos trilhos, com a sua reorganização política e fiscal, e crescimento econômico, do consumo e do emprego.  

Mas isso dificilmente ocorrerá.

Primeiro, porque a bolsa subirá fortemente por um intervalo curto, e muita gente vai ganhar milhões de reais, em poucos dias, especulando com o câmbio e com ações, mas, depois, o peso da crise internacional, que depende de fatores como a China e o preço das commodities, incluído o petróleo, voltará a se impor, assim como a percepção, como já mostram matérias em jornais estrangeiros como o New York Times, de que o que está ocorrendo no Brasil é um golpe judiciário-midiático organizado por gente como Eduardo Cunha, contra uma presidente da República sobre a qual não pesam acusações de enriquecimento ilícito.  

E, em segundo lugar, porque o país continuará, de fato, imobilizado, sob impeachment permanente, porque, no dia seguinte ao de sua posse, poderá começar, clom a banalização da utilização desse instrumento a partir de agora, o processo de impeachment do hoje vice-presidente Michel Temer, baseado no fato, lógico, consequente, dele ter cometido os mesmos supostos “crimes” de Dilma, em uma situação que será influenciada também pela atitude que será adotada por um PT ferido e indignado com a queda da Presidente da República.

Meses se passarão, no tempo em que se desenrolar o impeachment de Michel Temer.

Depois dele, em caso de aprovação, se já não tiver sido – o que é cada vez mais improvável – cassado Eduardo Cunha, começará a ser discutido o impedimento do Presidente da Câmara dos Deputados, caso ele venha a tomar posse como Presidente da República.

E, depois, ocorrerá o mesmo com o Presidente do Senado, Renan Calheiros, caso este venha a suceder o atual Presidente da Câmara dos Deputados, até que as eleições de 2018 venham a ser provavelmente realizadas sob a batuta do Ministro Ricardo Lewandowski, como último elo da corrente sucessória presidencial.

O impeachment da Presidente Dilma, portanto, não acabará com o “impedimento” do Brasil.

Com ela no poder, em sua peculiar situação atual, ainda é possível forjar um amplo acordo nacional que garanta a governabilidade, mesmo que seus adversários venham a vencer – se concentrarem-se nisso e não no caos – as eleições municipais deste ano, aproveitando o enfraquecimento institucional do Partido dos Trabalhadores.    

Sem ela, o avanço do estraçalhamento  político e econômico do país continuará, inexoravelmente.

Não apenas por causa da insegurança jurídica que envolve os três possíveis “impincháveis” seguintes, em sua linha de sucessão.

Mas também porque nesse clima de incerteza e de disputa pelos despojos – já se começa a dividir a pele do urso, ou melhor, da ursa, antes que ela tenha sido abatida pelo caçador – depois de toda essa lambança vai ser difícil costurar uma aliança que dure o suficiente – considerando-se principalmente as incógnitas Moro e Bolsonaro – para a travessia até 2018, e - como diria o astronauta de plástico, Buzz Lightyear - se o país não começar a tomar juízo, política e democraticamente – depois de 2018, ao infinito...e além!            

14 de abr. de 2016

OS MAGOS E O MONSTRO









(JB Online) - Dizem que, certa vez, querendo derrotar um adversário, um grupo de magos e de aspirantes a magos – entre eles havia numerosos aprendizes de feiticeiro – reuniu-se para construir uma criatura monstruosa, que pudesse destroçar, impiedosamente, o inimigo.


- Vamos fazer uma cauda longa e forte, coberta de espinhos - disse um deles.

- E uma boca imensa como um precipício, com duas fileiras de dentes de tubarão, tamanho X-G – disse outro.

- E seis patas, longas como lanças e grossas como porretes, que possam perseguir e acuar qualquer um que esteja se vestindo com as cores deles – afirmou o terceiro. 

- Cada uma com 12 garras, afiadas e curvas, como espadas de sarracenos – reforçou mais um.

- Tudo isso unido, por este tronco aqui – sugeriu outro - grosso como o de um rinoceronte.

- Coberto com escamas em lâminas, que cortem como cacos de vidro – propuseram outros, que tinham acabado de chegar ao encontro.

E durante meses os magos assim procederam.

Além de detalhes físicos, inúmeros, foram acrescidos à receita condenáveis sentimentos, que iam sendo reunidos para alimentar, na fase final, o monstro por via intravenosa, já que ele, como um abominável frankenstein canídeo, ressonava, roncando, no pátio do castelo, esperando o dia em que despertaria completamente, como a Bela Adormecida.

Por isso, no caldeirão em que fervia a poção que era injetada, como um soro fétido, no monstro, por mil agulhas espalhadas pelo corpo, se juntaram o ódio mais virulento, as mentiras mais descaradas, o preconceito mais arrogante, a violência mais sádica, a ignorância mais teimosa, a manipulação mais descarada e a mais cínica hipocrisia.

Nesse afã, passaram-se dias, semanas.

Até que, meses depois, em um crepúsculo lento e friorento, os magos se reuniram nas arquibancadas do pátio do castelo, para acordar, finalmente, a estranha criatura.

Para isso, um mago anão, equilibrista, subindo ousadamente sobre o rabo do monstro, percorreu lenta e solenemente o seu tronco, e, escalando sua cabeça, aproximou-se do focinho repugnante e disforme, para soprar, precedido pelo som de trombetas, em suas ventas, com um canudo feito de despachos judiciais, manchetes de jornal e capas de revista, o vapor azulado da existência.

Passaram-se então alguns segundos, de ansiedade e expectativa, em que se poderia ouvir o zumbido de um inseto.

E no instante em que o monstro se levantou, resfolegando como o cão dos infernos, foi como se a terra tivesse, súbita e violentamente, estremecido.

A massa da gigantesca criatura balançou-se, de um lado para o outro, como uma montanha, atirando, sobre uma arquibancada mais alta, o anão-mago que havia lhe soprado a vida.

E quando, abrindo os olhos em chamas, ele escancarou a espantosa bocarra, mostrando a garganta escura e profunda como um poço, emoldurada pelas longas fileiras de dentes, de onde explodiu, como uma bomba, o poderoso trovão de seu rugido, fazendo com que todo mundo saísse correndo, desabaladamente, ainda ouviu-se, desesperado e agudo, um grito lancinante:

- Ih! Ih! Corre, macacada, corre!

A gente se esqueceu de colocar a coleira!

Se tivessem acesso a um pequeno livro de contos morávios da segunda metade do medievo, que comprei em um velho sebo em Praga, que me inspirou o início deste texto, certamente o PSDB e o próprio PMDB teriam pensado duas vezes antes de agir como os magos e os seus aprendizes, e optar, uns de forma planejada, outros de maneira crescente e intuitiva, por incentivar e  cevar, com a velha, surrada, manipulada bandeira do combate à corrupção de sempre,  o monstro da antipolítica,  e por abandonar o calendário eleitoral normal para embarcar em um jogo suicida de encarniçado perde-perde  do qual, como se pode ver também pelas últimas pesquisas, todos, ou quase todos, sairão exangues, feridos e derrotados, e em situação muito pior do que a que estavam antes.

Nos últimos anos, e principalmente nos últimos meses, da Copa do Mundo para cá, muita gente insistiu em empurrar, radical, emotivamente, a população e a opinião pública contra o governo Dilma, como se disso dependesse a salvação do país.

E o que se conseguiu foi criar uma grande massa de brasileiros que nutre o mais profundo desprezo pela política, pelo Congresso, pelos partidos, pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Poder Executivo, e que não tem – e não quer ter - a menor ideia de como funciona um regime democrático ou o presidencialismo de coalizão, e uma plutocracia que coloca, com o mesmo discurso,  a sua própria sede de poder na frente dos interesses econômicos - e estratégicos - nacionais.
Uma turba que, da defesa da tortura, da ditadura, do assassinato de adversários políticos, ao anseio de uma democracia direta feita na base da porrada e do porrete, exercida pela força, a pressão e a violência, exibe os mais esdrúxulos devaneios e delírios, tendo como únicos pontos de união um anticomunismo  tosco e anacrônico, o ódio ao estado, o desprezo pelo Brasil e por suas conquistas e preconceitos de todo tipo e que só aceita – até agora – a liderança de dois personagens desequilibrados pelo ego e pela ambição, que representam, a médio prazo, um imponderável, incalculável, extremado risco para a sobrevivência da democracia e das instituições.

O PT, de sua parte, embora não possa ser incluído no “círculo mágico” a que nos referimos, fez, paradoxal e infelizmente, quase todo o possível para o crescimento dessa receita.

Alimentou, ao longo de anos, com bilhões de reais, uma mídia parcial, seletiva, inimiga, quando, até mesmo usando o sábio pretexto da austeridade, poderia ter evitado fazê-lo, suspendendo, ou limitando à publicidade legal obrigatória, toda a propaganda paga do governo. 
         
Abandonou, sem nenhuma estratégia que pudesse impedi-lo, os espaços aparentemente “neutros” e de maior “audiência” da internet para a direita, e, depois, para a extrema direita, permitindo que, sem nenhuma reação em contrário, eles se tornassem o principal caldo de fermento de uma malta ignorante, violenta, hipócrita, manipulada e burra, parte dela oriunda de um público que as próprias políticas sociais do Partido dos Trabalhadores havia levado a ter acesso, por meio da inclusão digital, a computadores, tablets, celulares e conexões de rede.


Não estruturou um discurso claro, baseado em dados simples, em nada cabalísticos, do PIB, dívida pública, carga tributária, que pudesse desmentir teses estapafúrdias como a de que quebrou o Brasil nos últimos 13 anos, ou de que sucateou as Forças Armadas, quando lançou o maior programa de rearmamento da área de defesa dos últimos 500 anos.  

Alguns de seus dirigentes se entregaram à aceitação de pequenos, perigosos e absolutamente desnecessários “favores” - não ilegais, mas moral e politicamente discutíveis - e outros personagens se entregaram a operações de “consultoria”, prestadas não apenas a empresas brasileiras – coisa totalmente compreensível, no apoio por exemplo, à exportação de serviços e equipamentos nacionais – mas também a companhias multinacionais, algumas delas - não necessariamente por influência do PT, mas em seus governos  - beneficiadas, nos últimos anos, por “perdão” de impostos e empréstimos bilionários, lembrando, nessa aproximação, o que ocorria nos governos  neoliberais e entreguistas anteriores.

O caminho para o cadafalso foi percorrido, inexoravelmente,  até agora, com a resignação e a inação de quem achava que algum milagre sempre ia ocorrer na etapa seguinte, à volta da esquina, quando o golpe em andamento só faltou ser anunciado em luzes de neon, por fatos como o deslocamento - para o qual chamamos a atenção à época - para Brasília, da mesma embaixadora norte-americana que estava lotada em Assunção no processo de derrubada jurídico-político- midiática do Presidente Fernando Lugo.   

A oposição tem perdido apoio e intenção de votos com o discurso geral de judicialização e criminalização da política, na mesma proporção em que seus membros são acusados de corrupção, quase que exatamente com os mesmos pretextos, jogadas e subterfúgios – principalmente a transformação de doações legais em ilegais e delações premiadas negociadas em troca da liberdade mesmo que provisória de detidos - que antes se utilizavam apenas contra membros do PT e da coalizão governista.

O Congresso também perdeu como um todo, institucionalmente, bastando para isso ver a quantidade de membros do legislativo processados pela justiça - incluídos os presidentes da Câmara e do Senado - ou apenas no âmbito da Operação Lava-Jato, como é o caso, por exemplo, da composição da própria Comissão que aprovou, em primeira votação, por maioria simples, o impedimento da Presidente da República.

A Operação Lava-Jato, insuflada pela oposição no início, e pela mídia conservadora durante todo o tempo, e o esporte nacional de acuar e inviabilizar o governo, aprofundaram o efeito da crise econômica internacional, arrebentando com a governabilidade e com a economia e quebrando milhares de brasileiros, que, até mesmo por isso, estão se afastando também da política tradicional, “seduzidos”, como sempre, por novos e velhos paraquedistas que dizem que não são “políticos”.

Quanto ao PMDB, se nem os magos e seus aprendizes conseguiram se aproximar da criatura que geraram – por hora disposta a ganhar afagos e festas de apenas duas pessoas, o Juiz Sérgio Moro e o Capitão Jair Bolsonaro, que se aproximam, perigosamente de 16% dos votos;

Se a malta fascista que está nas ruas, criada com o leite amargo do ódio e o pão de ló da criminalização e desconstrução da política que a oposição e a imprensa amassaram com o rabo, não aceita sequer a presença do PSDB partidário em suas manifestações, das quais já expulsou Aécio e Alckmin, nem a do Presidente da FIESP – que foi cantar o hino nacional e por pouco não saiu tosquiado, ou melhor, pagando o pato;

E nem mesmo a do “líder” dos Revoltados Online, que apesar de travestido de fascista, foi acusado de comunista e de “estar a soldo do senador Aécio Neves” porque tentou fazer um alerta à turba de “homens de bem” e teve que sair sob proteção policial da Avenida Paulista;

De onde o PMDB “recém-dissidente” tirou a ideia, ou melhor – aos gritos de “Fora PT” no Congresso - a ilusão, de que seria tratado de forma diferente após a traição contra o PT por aqueles que se convencionou chamar de “coxinhas”, ou pelo Judiciário, ou pela “imprensa”, depois de ficar mais de uma década apoiando e participando da coalizão governista?

Será que esse partido não sabe que dificilmente o Vice-Presidente Michel Temer deixará de ser a bola da vez em uma longa fila de impeachments?             

Bom ou mau, o PT tinha um acordo com o PMDB em busca de uma possível, às vezes frágil, quase sempre sabotada, governabilidade. 

A imprensa, o Judiciário, os "mercados" não tem nenhum.

Ainda esta semana, em entrevista ao jornal Valor Econômico, o empresário Francisco Deusmar, dono da rede de farmácias Pague Menos, com 830 lojas no país, disse que, em caso de impeachment,  seria melhor que o Vice-Presidente da República não assumisse."Tem que ser como no futebol - afirmou - o time está perdendo? Muda a Comissão Técnica toda. 

E o ex-presidente do Banco Central Gustavo Loyola, lembrou que não dá para saber que tipo de apoio teria um eventual governo Michel Temer.   
  
Perguntamos, se haverá eleições municipais daqui a seis meses, para que quebrar as regras do jogo?

Para que romper a aliança – mesmo que frágil – de uma coalizão já existente, para tentar, sem nenhuma garantia de êxito, se aliar subalternamente a todo tipo de adversários, que não têm por você a menor simpatia ou respeito?

O que é melhor, atravessar o rio em conjunto com o grupo com que, ao menos aparentemente, se   estava enfrentando, até mesmo por imposição do campo adversário, as mesmas vicissitudes e desafios?

Ou substituir regras democráticas previsíveis, periódicas, pelo imponderável “pega pra capar” de uma destrutiva briga de foice no escuro – e ser usado como boi de piranha para tirar as castanhas do fogo para sabe se lá quem chegar ao poder, pisando por cima do seu pescoço?

Os ministros do PMDB que permaneceram no governo recusaram-se a queimar suas naves, como Agathocles nas praias de Cartago.

Ao romper com Dilma, por sua vez, outro lado do PMDB lançou-se à travessia – que promete ser longa e não isenta de desafios - de uma espécie de Rubicão golpista caboclo.

E um terceiro grupo, nacionalista e legalista, tende a manter-se – provavelmente em defesa de suas respectivas biografias – por convicção, contra o impeachment, como Roberto Requião e Kátia Abreu, por exemplo.

Esquecendo-se das conveniências de curto prazo, que nem sempre são boas conselheiras. 

Em Política e na História, por maiores sejam a pressa e as dúvidas eventuais, no lugar de ficar com o caminho fácil do senso comum é sempre melhor ficar com o bom senso.

Ou corre-se o risco de morrer como o escorpião que picou a rã – que lhe dava carona - no meio do rio.

O futuro dirá se foi por estratégia, por “natureza” (como fez o artrópode da fábula) ou por estultice mesmo.

8 de abr. de 2016

O CARGUEIRO E AS HIDRELÉTRICAS.









(Jornal do Brasil) - O céu era “de brigadeiro”.

Mas, para a maior parte da mídia passou em brancas nuvens a apresentação do novo cargueiro militar KC-390 da EMBRAER à Presidente da República, ao Ministro da Defesa, Aldo Rebelo, e ao Ministro da Aeronaútica, Nivaldo Luiz Rossato, após viagem de Gavião Peixoto à Capital Federal, nesta semana, na Base Aérea de Brasília.

E, no entanto, tratava-se apenas da maior aeronave já construída no Brasil, com capacidade de transporte de blindados, de brigadas de paraquedistas, de operar como avião-tanque para reabastecimento aéreo de caças, ou como unidade de salvamento, em um projeto que custou 7 bilhões de reais, em grande parte financiado pelo Governo Federal, que teve também  participação minoritária de outros países, como Portugal, Argentina e a República Tcheca, destinada a substituir, no mercado internacional, nada menos que o Hércules C-130 norte-americano.

A mesma indiferença, para não dizer, desprezo, ou  deliberada desinformação, ocorreu com o início do processo de geração da usina hidrelétrica de Belo Monte, no Pará, a terceira maior do mundo, com capacidade de 11.000 megawatts, na semana passada.

Ou com a hidrelétrica de Santo Antônio, situada no Rio Madeira, em Rondônia, a quarta maior do país, que colocou em operação sua 39ª turbina geradora há alguns dias.

Como sempre se dá com os grandes projetos erguidos nos últimos 13 anos neste país – e põe obra nisso – escolheu-se dar atenção, prioridade e  divulgação preferencial a aspectos negativos, discutíveis e polêmicos como eventuais “estouros” de orçamento, atrasos ou suspeita de corrupção, do que às próprias obras.

Projetos que, depois de prontos, passarão a pertencer, inexoravelmente, ao patrimônio nacional e ao domínio do concreto, da realidade – e que, querendo ou não seus detratores – continuarão, agora e no futuro, beneficiando o país com mais empregos, mais energia, melhora no nível tecnológico de nossa indústria bélica e aeroespacial e da capacidade de defesa da Nação.

Bom mesmo, para essa gente, deve ter sido o governo do Sr. Fernando Henrique Cardoso, que, segundo o Banco Mundial, conseguiu encolher o PIB e a renda per capita do Brasil em dólares nos oito anos em que permaneceu à frente do Palácio do Planalto, aumentou a carga tributária em vários pontos percentuais e duplicou a relação dívida líquida-PIB, além de deixar uma dívida de dezenas de bilhões de dólares o FMI, sendo obrigado a racionar energia por falta de investimentos na geração de eletricidade - além de deixar que desaparecessem empresas como a ENGESA, sem forjar um simples parafuso para as forças armadas.

Naquele tempo não se discutia a suspeita de irregularidades na construção de usinas, refinarias, plataformas de petróleo, gigantescos sistemas de irrigação e saneamento, ferrovias, tanques, submarinos – até mesmo atômicos - usinas nucleares, estádios, aviões, mísseis, porque não se fazia quase nada disso em nosso país, e, quando havia encomendas, poucas, eram para o exterior, e não para aqui dentro.

Aludia-se, sim – muito timidamente com relação ao que se faz hoje – à possibilidade da existência de irregularidades na compra da emenda da reeleição no Congresso; e na sabotagem, esquartejamento, destruição, por exemplo, de grandes empresas nacionais, algumas delas centenárias, a maioria estratégicas, para sua entrega, a preço de banana, para estrangeiros, com financiamento farto, subsidiado, do BNDES.

Lembrando George Orwell - em seu inesquecível e cada vez mais atual “1984” - o Ministério da Verdade, ou Miniver, em “novilíngua” - formado pela parte mais seletiva, parcial, ideologicamente  engajada e entreguista da mídia brasileira - pode fazer o que quiser – um diário chegou a trocar a foto de Dilma na cabine do KC-390, por outra, menos “favorável”, em pleno processo de impressão da tiragem do dia seguinte ao fato - que não se conseguirá derrubar  obras como Belo Monte, Telles Pires,  Santo Antônio, ou Jirau, ou o novo trecho da ferrovia norte-sul, que já leva soja de Anápolis ao Porto de  Itaqui, no Maranhão, ou paralisar – com a desculpa de que vão dar ou deram prejuízo (prejuízo contábil, virtual, não interessa, afinal, dinheiro se necessário, como fazem os EUA, se fabrica), como se não bastassem o 1 trilhão e 500 bilhões de reais em reservas internacionais que o Brasil possui – a construção da Transposição do São Francisco ou a expansão da refinaria Abreu e Lima, que já está processando, em sua primeira fase, cerca de 100.000 barris de petróleo  por dia.

As obras e as armas construídas, para o Brasil, como os fuzis de assalto IA-2, ou os radares SABER, ou o Sistema Astros 2020 – até mesmo porque as Forças Armadas não vão permitir que esses programas venham a ser destruídos e sucateados - vão ficar, por mais que muitos queiram  que elas desapareçam em pleno ar, em uma nuvem de fumaça ou nunca venham a ser vistos em um livro de história.

Et latrare canes caravanis transit – ouviu, certa vez um romano, em um ponto qualquer da rota da seda, entre as dunas do deserto do Saara.
O calendário da pátria não se mede com o ponteiro fugaz das vaidades humanas.

O que importa para o Brasil é o que fica.

No futuro, o povo saberá datar essas conquistas - separando o joio do trigo - no tempo e nas circunstâncias.