Encerrada a ressaca das eleições municipais deste ano, o ambiente político
brasileiro continua recomendando cautela aos observadores, que tendem a agir
com o cuidado de equinos que, em dia de
neblina, tateiam, com a ponta dos cascos, os limites da pirambeira da trilha de
cascalho em que se encontram.
A vitória do PSDB, cujo maior símbolo foi a eleição, em primeiro turno,
na cidade de São Paulo, do Sr. João Dória Júnior, com menos votos que os nulos,
brancos, e as abstenções, foi também o triunfo da antipolítica e da terra
arrasada, como consequência da criminalização da atividade pública, que
espantou os eleitores e tolheu a sua presença nas urnas eleitorais e o seu apoio a este ou àquele nome.
Há que se frisar o importante papel exercido por certa mídia, a mais parcial
e venal, nesse processo, que não escondeu, em frente às câmeras, e nas capas das
revistas semanais, sua lúbrica, babosa,
satisfação com o resultado, e com a coroação de um bem sucedido trabalho de
anos de cínica manipulação da opinião pública.
Provisório, se não descartável, para muitos daqueles que saíram
vitoriosos das urnas, o PMDB - que deu origem aos tucanos - e que já foi, em
parte, no passado, baluarte da redemocratização e do nacionalismo no Brasil - pode ser
defenestrado do Palácio do Planalto a qualquer momento se não fizer direitinho o dever de
casa determinado pelo discurso e a agenda entreguista e conservadora.
O desmonte e esquartejamento da Petrobras, a entrega do pré-sal e o fim
do estado brasileiro, por meio da aprovação do teto de despesas do governo,
excrescência que só existirá no Brasil, já que não há país desenvolvido que não
tenha crescido por meio do endividamento,
abrem caminho para uma nova fase da vida nacional, cujo maior símbolo é
a volta das missões do FMI a um país que é credor da instituição e que, com 370
bilhões de dólares em reservas internacionais, ocupa o posto de quarto maior detentor de títulos do tesouro
norte-americano.
A decepção da população brasileira com o PT, favorecida pelos erros do
partido e por mega-factoides como o do Mensalão, que, apesar de manter o país
em suspense por dois anos, envolveu menos de 70 milhões de reais, e o do
suposto "Petrolão", que não conseguiria passar, sem os bloqueios e
multas punitivas bilionárias por "danos morais" e sem a transmutação
retroativa de doações normais de campanha em propina, de algumas dezenas de
milhões de dólares (o mais é fruto de ilações
nascidas de delações forçadas, arrancadas de indivíduos detidos
indefinidamente como o ex-ministro Antônio Palocci está agora, sob permanente
"custódia" da República de
Curitiba) deu origem a um crescente número de votos nulos e de cidadãos que não
compareceram às urnas, que retira boa parte da representatividade dos eleitos,
e que não pode ser nada bom para a jovem - e periclitante - democracia
brasileira.
Contra o retrocesso político e o econômico, a única saída no horizonte é
a negociação e o bom senso.
A esquerda não pode colocar apenas no PMDB., ou no PSDB, a conta de um
golpe anunciado, que todo mundo sabia que iria ocorrer, desde, que, pelo menos,
inaugurando uma série de episódios mais que sintomáticos, sutis como Dinossauros,
Dilma foi insultada em pleno estádio, de forma estúpida e chula, na abertura da Copa do Mundo de 2014.
Independente de suas eventuais conquistas, o PT - e não estamos nos
referindo à sua militância - foi fraco, dividido, arrogante, medroso,
incompetente, equivocado e omisso na resposta e nas reações à articulação
estabelecida para derrubá-lo.
Agora, seria recomendável que assumisse sua quota da responsabilidade -
que não pertence apenas a seus adversários - pelo retrocesso estratégico e
histórico que o país está vivendo, e que fizesse uma urgente e pragmática
autocrítica, diante do que está acontecendo com a Nação, antes que o desastre -
para mal da diversidade democrática do espectro político nacional - se repita,
em maior proporção do que ocorreu, agora, com a legenda, nas próximas
eleições.
Não adianta querer agir intempestiva e
desarticuladamente, para colocar tramela na porta depois que a casa foi
quase que definitivamente arrombada.
É hora de determinar e unificar estratégias - viáveis - e recolher os
cavalos de batalha, ou melhor, de tirar o cavalinho da chuva e parar para
pensar no futuro e no que se vai fazer com ele.
Da mesma forma que o eventual isolamento do PSDB em uma situação de
força, quando lhe caberia liderar, neste momento, se não estivesse dividido e
contaminado, no caso da maioria de suas lideranças, por uma deslocada visão de mundo, a reação
da política em torno da defesa das instituições; o crescente isolamento -
também em boa parte dos casos estéril -
de alguns segmentos mais indignados e desesperançosos da esquerda, e
principalmente da esquerda nacionalista, embora compreensível, não favorece em
nada a liberdade e a democracia.
Ele apenas - principalmente se o PSDB caminhar ainda mais para a direita
- pavimentará, como já se viu pela relação dos vereadores eleitos para a cidade
do Rio de Janeiro nestas eleições, o caminho para a ascensão do fascismo em
2018.
E só pode beneficiar os inimigos do Brasil e de sua soberania, que se
deleitam, lá fora, enquanto fincam o pé,
aqui dentro, aproveitando o avanço do
esquartejamento e da liquidação do país, com um célere e desastroso retorno a
uma situação de colônia - que nos afastará da negociação - em que nos colocou a
condição de uma das dez maiores economias do planeta - dos destinos do mundo neste vigésimo-primeiro século, ainda tão jovem quanto desafiante.
2 comentários:
Eu ainda acredito, Mauro, no Brasil. De fato, esse golpe foi o "fim da picada" para a trajetória que estávamos traçando, mas eu ainda acredito. Esses garotos paralisando as aulas no Paraná, essa seca que vem dos céus paralisando o butim sobre nossas empresas - só falta o país acordar para a questão do petróleo.
Mas eu não espero uma atitude do PT como a que você sugere, de co-participação na situação atual. Eles se apegam nas coisas boas que fizeram, como tirar 30 milhões da miséria - para ficarem de "braços cruzados". Estou percebendo, lendo seu artigo, ser um grande erro deles: é como se eles não percebessem o fim da picada.
Força PT, força Brasil!
Sempre lúcido e pertinente o Mauro. Parabéns. Devemos continuar o combate, desconstruir as mentiras relativas ao endividamento e da corrupção. Um abraço.
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